MPI (família)

Disse que tinha vindo de Viana do Castelo para estar ali, em Lisboa. No seu jeito despachado, mãos nos bolsos, muito segura de si, daquilo que é e do que tem, disse ainda que tinha filhos e que colocava a sua família à disposição para o que fosse preciso. Ao lado, a sua companheira olhava-a. No olhar, um sorriso de orgulho.

E a mim apeteceu-me ir lá, abraçá-las e perguntar como foi que se conheceram e que tudo aconteceu. Ando com umas vontades muito pouco comuns em mim em relação a desconhecidos.

MPI (notas soltas)

- Ana Zanatti fuma de boquilha. Elegância em estado puro (e não apenas pela boquilha, obviamente). A sua voz serena e sincera de quem diz tudo;

- Daniel Sampaio disse o essencial das razões que a todos movem. Porque acredita no casamento com base no amor. E porque isso deveria bastar.

- Fernanda Câncio brilha por onde passa: aquele vestido preto fica-lhe muito bem e o simples facto de dar a cara fica-lhe ainda melhor;

- Isabel Mayer Moreira vive intensamente aquilo que pensa. Mulher de garra, mesmo que lhe trema a mão, não lhe treme a voz e a certeza. O seu discurso deveria estar disponível para todos;

- Pedro Marques Lopes tocou no ponto certo ao dizer que lhe enerva a história das prioridades, pois não concebe nada mais prioritário do que uma pessoa poder viver em pleno a sua igualdade e dignidade. Tem toda a razão;

- Miguel Vale de Almeida é bastante sensato (e sensual, diga-se) e expôs com clareza a sua noção de Movimento;

- É muito interessante descobrir a cara por detrás do blogue, em carne em osso - Nascidos do Mar, Arrastão, Da Literatura, Jugular.

E agora, toca a subscrever.

Por favor subscrevam

MOVIMENTO PELA IGUALDADE no acesso ao casamento civil

A igualdade no acesso ao casamento civil é uma questão de justiça que merece o apoio de todas as pessoas que se opõem à homofobia e à discriminação. Partindo da sociedade civil, a luta pelo acesso ao casamento para casais de pessoas do mesmo sexo em Portugal conta neste momento com um crescente apoio político e social. Nós, cidadãos e cidadãs que acreditamos na igualdade de direitos, de dignidade e reconhecimento para todas e todos nós, para as/os nossas/os familiares, amigas/os, e colegas, juntamos as nossas vozes para manifestarmos o nosso apoio à igualdade.

Exigimos esta mudança necessária, justa e urgente porque sabemos que a actual situação de desigualdade fractura a sociedade entre pessoas incluídas e pessoas excluídas, entre pessoas privilegiadas e pessoas marginalizadas; Porque sabemos que esta alteração legal é uma questão de direitos fundamentais e humanos, e de respeito pela dignidade de todas as pessoas; Porque sabemos que é no reconhecimento pleno da vida conjugal e familiar dos casais do mesmo sexo que se joga o respeito colectivo por todas as pessoas, independentemente da orientação sexual, e pelas famílias com mães e pais LGBT, que já são hoje parte da diversidade da nossa sociedade; Porque sabemos que a igualdade no acesso ao casamento civil por casais do mesmo sexo não afectará nem a liberdade religiosa nem o acesso ao casamento civil por parte de casais de sexo diferente; Porque sabemos que a igualdade nada retira a ninguém, mas antes alarga os mesmos direitos a mais pessoas, acrescentando dignidade, respeito, reconhecimento e liberdade.

Em 2009 celebra-se o 40º aniversário da revolta de Stonewall, data simbólica do início do movimento dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais e transgéneros. O movimento LGBT trouxe para as democracias - e como antes o haviam feito os movimentos das mulheres e dos/as negros/as - o imperativo da luta contra a discriminação e, especificamente, do reconhecimento da orientação sexual e da identidade de género como categorias segundo as quais ninguém pode ser privilegiado ou discriminado. Hoje esta luta é de toda a cidadania, de todos e todas nós, homens e mulheres que recusamos o preconceito e que desejamos reparar séculos de repressão, violência, sofrimento e dor. O reconhecimento da plena igualdade foi já assegurado em várias democracias, como os Países Baixos, a Bélgica, o Canadá, a Espanha, a África do Sul, a Noruega, a Suécia e em vários estados dos EUA. Entre nós, temos agora uma oportunidade para pôr fim a uma das últimas discriminações injustificadas inscritas na nossa lei. Cabe-nos garantir que Portugal se coloque na linha da frente da luta pelos direitos fundamentais e pela igualdade.

O acesso ao casamento civil por parte de casais do mesmo sexo, em condições de plena igualdade com os casais de sexo diferente, não trará apenas justiça, igualdade e dignidade às vidas de mulheres e de homens LGBT. Dignificará também a nossa democracia e cada um e cada uma de nós enquanto cidadãos e cidadãs solidários/as – e será um passo fundamental na luta contra a discriminação e em direcção à igualdade.

Música do meu dia

Aqui me tens

Aqui me tens, longe e perto, como afinal quando estávamos juntos. Creio que te desconcerto. Não admira: eu também respiro incerteza, instabilidade, só os heróis e os parvos se sentem seguros de si - e os heróis nem sempre.

Urbano Tavares Rodrigues, Fuga Imóvel

Que é o amor?

E jogamos. Connosco. Com as palavras. Com as roupas, com as leis que despimos, com o tempo, contra o tempo.
Que é o amor?, que é a ternura?, e o desejo? E o futuro?


Abraçamo-nos, daí nos vem a nossa força, é incrível como ela se me tornou preciosa, não se ama, de facto, a outro ser, nem pelo mérito nem pelo conhecimento que a palavra favorece ou ilude, mas apenas porque se ama. O que nele encontro, neste momento, é sobretudo a certeza de que existo.

Urbano Tavares Rodrigues, Fuga Imóvel

Inscrições


Bairro Alto

Vantagens da Agricultura

Fui a única que não veio para casa índia. Pele vermelha.

Espectadora

Entre copos de sangria, debaixo de um Sol que consome, e com uma vista que reconforta, falam de mim. Falam porque já me conhecem e porque a amizade praticada diariamente permite destas coisas. Do que sou, do que gosto, como ajo. Das minhas características, do meu futuro, do meu amor. Escolhem-me futuros e histórias de filme, como aquela de encontrar, através de uma medalhinha que achei no chão, a minha alma gémea.

Falar de mim é ainda e sempre invocar o teu nome como inevitabilidade. Têm razão, Moisés de outro Egipto, abri e preparei o caminho. Tem vantagem que eu não tive. Mas não importa mais. Lembro assim tudo, de forma objectiva e retrospectiva, e oiço-as como espectadora de mim mesma. Acham que aparecerá ainda o homem que me virará do avesso. Rio e volto os olhos para o rio.

Biografias

"Tu não és masculina, tu és bruta."

Marisa procura Cinderela


Não era meia-noite mas umas 17 horas talvez, na esplanada do Adamastor, Bairro Alto, Lisboa. Não é sapato de cristal delicado mas sim uma medalha (?) ou adorno de roupa (?), não sei bem. Dourada e fina, leve, numa extremidade tem uma espécie de sol e na outra uma espécie de folha. Estava no chão, na mesa onde nos sentámos, a última do lado esquerdo de quem entra. Tenho-a comigo, segredo de uma magnífica tarde de Verão. Procura e encontrarás.

Bolt

O filme mais fofinho de sempre.
(Tenho tantas saudades tuas bébé. Volta para a mana.)

Part of Me

Palavras de vida eterna

Acorda-me às 4h30 da manhã para, entre outras coisas, me dizer "Micax adoro-te! Não sei o que seria de mim sem as tuas palavras!".

Cheiro a Verão

O calor tem destas coisas. Não a conheço de lado nenhum mas o cheiro que tem agarrado ao corpo é tão bom (creme, protector solar, bronzeador?) e eu estou tão perto dela que me apetece beijar-lhe o ombro. Assim, sem dizer nada. Apanhá-la distraída a ler a revista e zás. Rapidamente, para ela imaginar que foi só imaginação, ou um dente-de-leão que, trazido pelo vento, lhe embateu no corpo quente.

Solidariedade

Levou um processo disciplinar e uma multa para ser solidária com a amiga. Mas o que a preocupou mesmo era que o polícia que a multou era super parecido com D. e chamava-se P. Não há dúvidas, o universo conspira nas nossas costas.

If I ain't got you



Deitar o teu corpo nú sobre a areia e amar-te até as ondas do mar nos lamberem os pés.

Vejo-o

Não estás mas continuo a ver-te. Parei o teu sorriso e as tuas covinhas no tempo, um dia quando distraída olhavas o Sol na varanda, e guardei-o para mim. É por isso que não estás longe - enquanto me lembrar do teu sorriso, pertences-me. Como me pertence tudo o que vivi e hei-de viver.

Continuo a ver-te, como vejo todos os que foram e hão-de ser. Vejo-te o arranhão na perna recente enquanto jogavas futebol, reconheço-te os ténis novos e na moda, sei-te a silhueta cada dia mais perfeita. Oiço-te o riso, já o esperava. Não rias, é verdade. Estás mais bonita, o amor faz dessas coisas. Basta ver como brilham os teus olhos. Nunca consegui definir a cor dos teus olhos, sabes? Dizer que são verdes é reduzir a sua imensidão de vidas e histórias. Mas hoje, agora, é simples: são brilhantes.

Sonho-te o futuro como visão anunciada. Vejo-te os filhos, não te imagino sem um filho a quem devotar esse tanto amor que carregas no peito, a quem aconchegar os lençóis e contar histórias de final feliz, com princesas de longos cabelos e cavaleiros gentis que as socorrem. Vejo-te mãe de família, sorridente e de alma tranquila, que reúne todos à mesa na partilha do pão. Vejo-te mulher-menina que pula e brinca despreocupada e sem medo de cair. Mas também mulher-mulher, bomba que explode, que come e sacia, morde e geme.

Vejo-te a vida longa e feliz. E também a confiança e a certeza que aí conduzirão. A determinação no jeito de andar em frente. O pior já passou, por isso segura a sua mão e caminha. Estás na direcção certa. Vejo-o.

De Mi para ti

É engraçado como para ti nunca arranjo palavras. Queria dizer-te e não consigo. Tudo me parece nada. Oiço-te a voz de gatinho criança, enquanto me contas, e encho-me de ternura de ti. Tão doce, tão pequenina que apetece fazer festinhas, prender num abraço sentido para nunca mais te largar aos Homens. Quando tudo me falha volto sempre para ti, que sabes de mim como se fosses eu. Hoje é a minha vez.

Passeio-te com vagar pelo mundo que corre. Tento distraír-te, mas hoje parece não resultar. Por isso oiço-te apenas. Gosto tanto de te ouvir. As luzes ténues da cidade que te hão-de iluminar o rosto existem sem pensar. Levo-te para junto do mar, nossa casa. Páro o carro para te ouvir o coração. Pousa a cabeça no meu colo e deixa que te adormeça entre carinhos no teu cabelo. Chora se tiveres de chorar, já descobriste que é uma necessidade regeneradora. Como sempre, estou aqui para te lamber as lágrimas, como o cão das lágrimas, aquele. Dizes que não importa. Olho-te e lembro-te que importa, claro que importa. Porque me importas tu. Sorris e abraças-me. Amizade não é aquilo que dizem ou escrevem. Amizade somos nós. Mi. Di.

Sonhos de uma noite de Euromilhões

Um dia, muito brevemente, vou encher a minha casa de quadros de Julião Sarmento. Hoje é dia de Euromilhões.



Parasita (a mulher que sou quando me conheço.)



Feminity as a Multipurpose Signifier (Pornstar)



A Desirable Social Space



Patterns of Nuclear Family Life

Escolher

Escolher é excluir por isso prefiro não escolher. Quero tudo, de todas as maneiras.

The Edge of Love II (my memorable quote)


- What does it mean when she smiles?


The Edge of Love I

A stranger has come
To share my room in the house not right in the head,
A girl mad as birds

Bolting the night of the door with her arm her plume.
Strait in the mazed bed
She deludes the heaven-proof house with entering clouds

Yet she deludes with walking the nightmarish room,
At large as the dead,
Or rides the imagined oceans of the male wards.

She has come possessed
Who admits the delusive light through the bouncing wall,
Possessed by the skies

She sleeps in the narrow trough yet she walks the dust
Yet raves at her will
On the madhouse boards worn thin by my walking tears.

And taken by light in her arms at long and dear last
I may without fail
Suffer the first vision that set fire to the stars.

Dylan Thomas

The Edge of Love


É um filme muito bom, não há dúvida. Do amor que é tão infinito que não cabe apenas numa pessoa, da amizade inesperada, de traições, triângulos, de promessas, da sombra da guerra e seus efeitos. Um drama cheio da poesia rica de Dylan Thomas, com uma excelente banda sonora e que foi filmado em muitos dos sítios por onde passou efectivamente o poeta.

Keira Knightly tem novamente um desempenho notável, que a confirma já como actriz eleita para este tipo de filmes de época (The Duchess, Pride and Prejudice, Atonement). De resto, os magníficos close-ups da actriz enquanto canta no filme, aquele rosto de anjo e os lábios sexualmente vermelhos, deixarão qualquer um petrificado.

Porém, é difícil não ceder à tentação da comparação e, embora este filme esteja realmente bem feito e com excelentes interpretações, não teve, para mim, o mesmo encanto de Atonement. Confirmem e deixem a vossa opinião também.

Amália

Simplesmente magnífico. Arrepia-nos e dá-nos um profundo orgulho do fado ser a língua de Portugal.




Impressionante como sabia tão pouco da vida de Amália...Surge-me agora uma vontade enorme de a descobrir.

Shameless rubbish to entertain the emperor*

Via 5 dias, descubro que a candidata escolhida por Berlusconi para o assento europeu é Barbara Matera. Há pessoas com muito olho para a política.



*gentilmente apelidada pela legítima do Sr Berlusconi

Tocha Olímpica

Dizer testemunho é também dizê-lo tocha olímpica, pois carrega em si um fogo imenso, roubado por Prometeu aos deuses só para o dar a ela. Fogo que arde, que propaga e que inflama. Inesgotável que tudo queima, onde toca. Fogo como sinal de vida e de manifesta luz que há-de guiar o Homem na mais dura treva, no mais doloroso abismo. Fogo que se consome em si mesmo e que se alimenta de alegrias pequenas, daquelas que bastam. A sua chama intensa de laranja avermelhado, verde, amarela e azul no seu âmago, purifica o coração do Homem que, atraído pela cor, nada mais teme, maravilhado. Tem poderes mágicos, esse fogo divino.

Confio-te então uma tocha olímpica. Peregrina de outras terras, não permitas nunca que aquele fogo se extinga. É ele que nos dá vida.

Elegia

Nem os dias longos me separam da tua imagem.
Abro-a no espelho de um céu monótono, ou
deixo que a tarde a prolongue no tédio dos
horizontes. O perfil cinzento da montanha,
para norte, e a linha azul do mar, a sul,
dão-lhe a moldura cujo centro se esvazia
quando, ao dizer o teu nome, a realidade do
som apaga a ilusão de um rosto. Então, desejo
o silêncio para que dele possas renascer,
sombra, e dessa presença possa abstrair a
tua memória.

Nuno Júdice

I wish you love

É isto. Com toda a sinceridade em cada palavra. Gostava que ouvisses e que tivesses a certeza. Diz-me que já o sabias, só porque um dia nos soubeste, e poderei então dormir.



I wish you bluebirds in the spring
To give your heart a song to sing
And then a kiss, but more than this
I wish you love
And in July a lemonade
To cool you in some leafy glade
I wish you health
But more than wealth
I wish you love

My breaking heart and I agree
That you and I could never be
So with my best
My very best
I set you free

I wish you shelter from the storm
A cozy fire to keep you warm
But most of all when snowflakes fall
I wish you love
But most of all when snowflakes fall
I wish you love

Passagem de Testemunho


Como missão maior e sagrada, entrego-te o testemunho. Somos estafetas, simples estafetas, e é nosso dever levar o testemunho o mais longe que consiga chegar no seu caminho. Vivemos só para o fazer chegar lá, onde todo o testemunho se torna protagonista. Existimos para que ele exista em toda a sua plenitude e sentido. Entrego-to para a mão aberta sem medo de o deixar cair - sei-o seguro contigo. Entrego-to sem medo de o ter perdido já - sei que nunca o larguei no caminho e que chegou até ti, como previsto. Entrego-to sem ciúme ou obsessão - sei que o ajudei a passar mais uma etapa e que uma nova, contigo, começa agora.

És estafeta, simples estafeta, como eu. Deves por isso saber que o aspecto técnico e táctico que mais importa é a entrega e recepção do testemunho, a sua transmissão, mão a mão. Tudo está na coordenação, o instante que separa o antes e o depois. Não podemos errar ou hesitar, ouves-me? Não importamos nós mas somente a suave e correcta passagem do testemunho, não esqueças. Deve ser feita de forma serena mas precisa, como um continuum, para que o testemunho não embata nas nossas mãos, para que não note de forma brusca que passou de uma mão para outra e assim, com tempo, se habitue à humidade e calor da nova mão que agora o segura.

Deve também a passagem ser feita sem medo de ambas as partes, para que não escorregue o testemunho de umas mãos que estariam assim molhadas de suor de nervos e ansiedade. É uma passagem subtil e gradual, não há pois que temer. Abre bem a mão - há quanto tempo esperavas já o testemunho que agora te passo? Por isso, recebe-o como se recebe a noiva prometida. Segura-o com força, prende-o entre os dedos como se dentro de ti. Entrego-to. Está na tua mão.

Acho que a nossa passagem correu bem, o juíz não assinalou qualquer marca. Tens agora o testemunho contigo. Peço-te que nunca o largue a tua mão. Confio-to, certa de que melhor do que ninguém o levarás até onde tem de chegar. Guarda-o da chuva e do sol, protege-o de estafetas da vida menos bem intencionados, cuida dele como se nunca antes tivesse estado noutra mão que não a tua. Acima de tudo, nunca o largues. Peço-to encarecidamente. É que também eu o amo e também eu me preocupo, mesmo que o testemunho nunca mais se lembre da textura da minha pele longo foi afinal o tempo em que só a minha mão conheceu.

Leva-o contigo aonde fores e não te desvies do caminho traçado. Corre enquanto conseguires mas descansa também; o tempo não conta e o ritmo não importa porque sempre chegamos aonde somos esperados. O que importa realmente é que o testemunho chegue e é por isso que to entrego sem medo ou peso na consciência. Porque sei que contigo está seguro. Porque sei que o consegues fazer chegar mais longe. Nunca o largues.

Noite

Viverias só de noite. Da noite. Do seu cheiro fresco a eternidade, da sua luz forte e inesgotável, da brisa quente e doce que te beija o cabelo e aconchega entre seus braços, como filho mais amado. Noite que protege os amantes, que liberta o reprimido, que disfarça as imperfeições. Tempo de seres e dos seres. É na noite que sonhas e que fazes. Te fazes. No seu silêncio, os pensamentos saem-te em estado bruto, sem adornos ou interrupções. Da vida e da morte. Nela te perdes e assim te vais encontrando. Mil vezes perdida, mil vezes achada. Ali estás tu, plena e cheia. Por isso não termines, ó noite. Fica comigo. Mais esta noite.

A Menina da Lua em Quarto Crescente

Lá no alto, vês? Não notas a sua sombra? Deixa-me contar-te melhor.

É ruiva, cor invulgar até para quem vive na Lua, e tem longas tranças que lhe tocam os pés frios, e que gosta de fazer e desfazer para entreter o tempo que lhe cabe. Tem um cabelo de Rapunzel por onde querem subir os sonhadores, que julgam não a magoar quando mão após mão se suspendem no seu cabelo. Acreditam que ela é mágica e que é por isso que não grita quando, com força, se agarram àquelas tranças.

Tem uma carinha inocente e, embora parecida com aqueles que vê lá embaixo, sabe-se diferente dos outros. Não sabe bem o que é ou porque só aparece ali em determinadas noites do mês, sempre crescentes, mas já sabe que não é anjo porque um dia viu um e a ela faltam-lhe as asas.

Está nua mas não o sabe, nunca ninguém lhe contou, e livres pêlos arruivados povoam-lhe o púbis, numa mata virginal. Quando chegam olham-na com deslumbramento mas nunca ninguém lhe contou porquê e assim ela acha-o natural.

É um trabalho que ela não escolheu mas de que se habituou a gostar: canta. Sentada, reclina-se na curvatura da Lua, joelhos flectidos e canta, brincando com os cabelos. São canções desconhecidas e em nenhuma ocasião iguais e ela canta-as como se nada mais pudesse fazer senão cantar. Uma melodia misteriosa e encantada que a todos os que a ouvem deslumbra. É assim que ela os atrai, sabes? Os sonhadores, aqueles que têm a cabeça na Lua. São estes os mais fáceis de cativar, porque já antes a sonharam e viram.

Mas repara como está hoje. Consegues notar a diferença? Sentada a olhar a Terra, uma perna para cada lado, os pés dançando para trás e para a frente, os cabelos soltos ao vento, os mamilos despontados de uma alegria indisfarçável, o sorriso de estrela. Hoje ela toca também. Um sonhador trouxe-lhe um velhinho bandolim na véspera e hoje ela canta e toca como uma mulher nova e renascida. Solta uma luz mais brilhante que ilumina o universo todo.

Maravilhado, outro sonhador aproxima-se.

Dolce Vita Tejo I

- Tops a um éro, olha Zé!

A loira tingida, raízes morenas, peito grande, banhas que lhe saem junto à cintura e que parece gostar de ostentar considerando o curto e brilhante top roxo que usa.

O rapaz com as tatuagens no braço, o brinco na orelha à Cristiano Ronaldo, as calças a arrojar pelo chão e os boxers que gosta de mostrar em público.

- Boxers a um éro, olha Kátia!

(não há melhor sítio para estudos sociais, de observação, do que um centro comercial.)

Dolce Vita Tejo

Tão grande, tão grande, que nem o víamos. Muito mal sinalizado...

Pub

Sexta é dia de Publidevoradores!

Podes existir mas não faças barulho

O pulso de uma sociedade em relação a dada questão também é legível nos seus comentários mais ou menos idiotas, mais ou menos ignorantes, mais ou menos coerentes. Há para todos os gostos. Ou como gostam de dizer: não me importo de que haja gente estúpida, sejam lá o que quiserem, desde que não me chateiem a mim.

Os perigos da proliferação

Desde que não haja muitos não há problema, desde que não chateiem. Agora se começarem a proliferar a espécie humana pode entrar em declínio. Já que eles próprios dizem que aquilo não é uma doença... Portanto se não é uma doença não tem cura, portanto temos de estar atentos.

um dos comentários à notícia anterior,
no Público


José Saramago, Lídia Jorge e Daniel Sampaio apoiam casamento entre homossexuais

O psiquiatra Daniel Sampaio, a constitucionalista Isabel Mayer Moreira e a actriz e escritora Ana Zanatti são três das personalidades que, no domingo às 16h, subirão ao palco do cinema São Jorge, em Lisboa, para explicar publicamente as razões pelas quais integram o Movimento Pela Igualdade no acesso ao casamento civil (MPI) e subscrevem o seu manifesto. Imediatamente antes, o documento será lido pela actriz Fernanda Lapa.

Atingindo já mais de setecentas adesões, o MPI conta com o apoio dos escritores José Saramago, Ana Luísa Amaral e Lídia Jorge, da realizadora de cinema Ana Luísa Guimarães, dos artistas plásticos Graça Morais e Julião Sarmento, da jurista Teresa Beleza, do jornalista Miguel Sousa Tavares, do cientista Alexandre Quintanilha, dos humoristas Herman José e Ricardo Araújo Pereira, dos actores Alexandra Lencastre, Catarina Furtado, Soraia Chaves, Filipe Duarte, Nuno Lopes e Pepê Rapazote. E também o cavaleiro tauromáquico José João Zoio e a figura da sociedade Lili Caneças.

No final da apresentação pública do movimento, haverá uma reunião para decidir sobre actuação futura. O MPI está a ser constituído para se assumir como movimento de pressão da sociedade civil sobre o poder político com o objectivo de obter dos partidos, no ciclo eleitoral que agora se inicia e que inclui legislativas, o compromisso de que o próximo Parlamento altere o Código Civil para que este passe a permitir o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.

Diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és

"Não sei se já repararam. Vital Moreira praticamente não tem aparecido sem José Sócrates ao lado e Paulo Rangel praticamente não tem aparecido ao lado de Manuela Ferreira Leite. Está certo. São sinais inequívocos que se extraem da campanha: tanto o PS como o PSD querem mesmo ganhar estas eleições."

Pedro Correia, sempre atento e perspicaz

Liberdade Condicional


Casais Improváveis

Monica e Chandler.

Pink Psycho

Fear or revere me but please think I'm special

There is something about yourself that you don't know. Something that you will deny even exists, until it's too late to do anything about it. It's the only reason you get up in the morning. The only reason you suffer the shitty puss, the blood, the sweat and the tears. This is because you want people to know how good, attractive, generous, funny, wild and clever you really are. Fear or revere me, but please, think I'm special. We share an addiction. We're approval junkies. We're all in it for the slap on the back and the gold watch. The hip-hip-hoo-fuckin' rah. Look at the clever boy with the badge, polishing his trophy. Shine on you crazy diamond, because we're just monkeys wrapped in suits, begging for the approval of others.

do filme Revolver

If (disfarce da minha vacuidade sob a forma de pseudo-intelectualidade*)

If you can keep your head when all about you
Are losing theirs and blaming it on you;
If you can trust yourself when all men doubt you,
But make allowance for their doubting too;
If you can wait and not be tired by waiting,
Or being lied about, don't deal in lies,
Or being hated, don't give way to hating,
And yet don't look too good, nor talk too wise:

If you can dream -- and not make dreams your master;
If you can think -- and not make thoughts your aim;
If you can meet with Triumph and Disaster
And treat those two imposters just the same;
If you can bear to hear the truth you've spoken
Twisted by knaves to make a trap for fools,
Or watch the things you gave your life to, broken,
And stoop and build 'em up with worn-out tools;

If you can make one heap of all your winnings
And risk it on one turn of pitch-and-toss,
And lose, and start again at your beginnings
And never breathe a word about your loss;
If you can force your heart and nerve and sinew
To serve your turn long after they are gone,
And so hold on when there is nothing in you
Except the Will which says to them: "Hold on!"

If you can talk with crowds and keep your virtue,
Or walk with kings -- nor lose the common touch,
If neither foes nor loving friends can hurt you,
If all men count with you, but none too much;
If you can fill the unforgiving minute
With sixty seconds' worth of distance run --
Yours is the Earth and everything that's in it,
And -- which is more -- you'll be a Man, my son!


Rudyard Kipling

* retirado de um post da Luna

Séries de Tv

Porque toda a gente anda a fazer esta corrente e eu também quero exibir-me um bocadinho, aí vão as minhas 15 séries favoritas de sempre, sem ordem definida:

- Friends;
- ER;
- Six Feet Under;
- The Sopranos;
- Dharma & Greg;
- The L Word;
- The O.C.;
- Las Vegas;
- Commander in Chief;
- The Family Guy;
- Tru Calling;
- Coupling;
- Dawson's Creek;
- Buffy, the Vampire Slayer;
- Felicity.

Todas as séries que passam na RTP2, obviamente. E as vossas?

Fantasma Revisited

Quantas mais vezes falo com ele (hoje, dia surpreendente, apareceu-me) mais tenho a certeza: não é isto.

Relatividade (o tamanho não importa)


"If you think you’re too small to have an impact, try going to bed with a mosquito in the room."

Anita Roddick

Nada, mas tentas

És só uma sombra, traço indefinido, erro que passa despercebido. Ninguém te vê. Personagem de ficção, és uma hesitação, o caminho menos percorrido, um beco sem saída. E és pó, conversa de circunstância, espirro embaraçoso, soluço que não passa. Gota de água que recebes na boca e te sacia a sede. Tentas e falhas, tentas e falhas. Mas não deixas de tentar.

Permissão para ser

Lembras-te quando estávamos no Porto, num daqueles barcos típicos que te são parentes e quase com os dedos a tocar a água do Douro, te fazia suaves carícias na mão, feliz daquele instante partilhado? Pediste-me depois que parasse, pois uma mulher olhava e comentava num esgar de desaprovação. Acedi ao teu pedido, não porque a mulher me importasse mas porque me importava o teu pedido.

Mais tarde, na estrada de regresso a casa, conduzias tu num Portugal que te ia ficando familiar, beijámo-nos com o carro em andamento, numa vontade de desejo, provocação e vingança. E soube tão bem...

(Contam-me da tristeza da crítica, da farpa do desejo reprimido, da dor de não se saberem livres. Asseguro-lhes que o dia virá. Até lá, vivam sem medo, gritem ao mundo, mostrem que não precisam de mais ninguém senão de vós mesmas. A liberdade começa aí.)

10 Things you didn't know about orgasm



via Womenage

Thinking of you

Não foi a página que se virou. Hoje fui eu quem a virei. As personagens alteraram-se pelo meio mas o final, esperado, mantêm-se: o viveram felizes para sempre. Espero genuínamente que sim. Uma nova história começará agora. Nesta sou personagem principal. E escrevo o meu destino.


ER

Entre House e Anatomia de Grey escolho o ER.

Escuta Activa

Ficou provado que tenho de melhorar esta competência. Sobretudo porque é uma exigência profissional. E permite evitar mal-entendidos. Como aquele. Pois.

Pior a emenda que o soneto (grr)

Afinal o meu português do Brasil não é tão fluente quanto eu pensava. Só depois me apercebi que li "de alguma forma" em vez "de forma alguma". Também eu tenho as minhas dificuldades com as palavras. Oops.

Incondicionalmente (coração)


É esta a palavra que separa uma simples amizade de uma profunda amizade. Profundamente, como nós.


Rules of the Game


- "You can only get smarter by playing a smarter opponent.”

- “The greatest enemy will hide in the last place you would ever look.”

- “The harder the battle, the sweeter the victory.”


- “Always protect your investment.”


do filme Revolver

Morrer

Hoje vão matar-me muitas vezes. Parece-me.

Ping-Pong (Carta Aberta a E.)

Deveríamos ter ficado naquela fase inicial, de quem se olha à distância, tira as suas conclusões e dá as suas bênçãos e basta. Não sei quem começou, provavelmente até terei sido eu. Sou politicamente incorrecta no que respeita a sinceridade. Falo demais e não tenho noção dos limites. Sou bruta nas palavras porque me saem sem medidas, nuas.

Não deixo de achar curioso o modo como me falas - de modo paternalista e como se achasses que me conheces. Dás-me recomendações sensatas, conselhos de quem tem vivido sempre sem limitações, vais-me mostrando a saída gentil e subtilmente sem nunca perderes a compostura ou caíres em deselegância. Mas o que te importa a ti se recordo, se guardo, se escrevo? Não será decerto preocupação comigo, por isso, confia. Repara: eu não existo.

Aliás, se procurares bem, verás que nem antes estou lá. Existi sim mas pouco para tudo o que eu queria existir. Não sou ingrata ou esquecida, sei bem que teria de ser assim. Mas, para todos os efeitos, não há sinais ou registos, não estou em fotografias, em mensagens ou em objectos que ficaram. Nunca estive na partilha pública e descontraída, nos (( )) que todos podem ver agora, contigo. Sempre fui a conversa tabu, a pessoa que nunca teve nome, a história que nunca aconteceu, o embaraço que teimam em ignorar. Apenas a dor que me ficou no peito, as doces memórias que mantenho e o tempo como testemunha me dão a certeza de que acontecemos. Perduramos sempre naquilo que nos transcende.

Preciso deixar claro que não te vejo como um obstáculo ou um desafio. Deves senti-lo melhor do que ninguém, recebes todas as certezas desejadas. O problema nunca foste tu, ou a distância ou a família ou o dinheiro. Seria tão mais fácil e reconfortante acreditar que sim, não te minto. Mas nem nisso me engano já: o problema sou eu e o encanto que se foi perdendo. Logo, não te preocupes comigo. Não estou a competir contigo, não há jogo ou troféu. Sei que este sentido de competividade excita-te, apura-te os versos, cria-te ideias. Tenho-o notado. Mas cuidado, pode ser viciante. Vamos por isso terminar este ping-pong, de quem faz a sua jogada e aguarda a manobra do outro lado. É despropositado e inútil. E duvido que tenha a sua aprovação. Que te parece?

Talvez não devesse ter escrito nada e pronto. Elas dir-me-ão isso, certamente. Não devias, Marisa, não devias. Também pode acontecer a emenda ser pior do que o soneto mas, neste momento, tenho muito pouco (nada?) a perder e, se te compreende e desculpa a ti os textos, há-de compreender-me e desculpar-me a mim esta atitude.

Não vou espreitar ou aguardar ansiosa. Deixo-te em paz. Não mais te lerei, acabou-se para mim o ping-pong. A caixa de comentários e o email estão à disposição.

Cumprimentos,

There's no one I would rather be with



It’s me, and you, and all the things we do,
Just to go a little more, just to find a better view,
Despite of young hearts we know how it’s gonna be,
We don’t get for your crops cause we have our own tree,
There’s nothing wrong with your ways, but we can dance to this song,
We just wanna build and leave the bridge out of the silent void.

If there’s something we could do,
To escape this silent void,
Just a word that we could say,
That would burn this silent door,
No we can’t stay here no more…

(We’re in love.. We’re in love)
I say love… I say love

And there’s no one I would rather be with,
Nothing I would rather do,
Cause I’ve got this dream, this heart that beats,
Outside this silent world, and I’ve got you.

…and me, and all that we could be,
Out if this black hole show, by the black sea,
We’re all surrounded by the old, just running their stuff,
We don’t really care for them, they don’t really care for us,
You see, I don’t wanna be what they meant all of us to be,
Shaking hands with the sales artist, the master degrees,
With the, lost kids and the loveless ones,
Yeah I can look like them but I’ll never be one,
And if you wanna be the bullet out of this gun,
Then tell us please what you’re made of,
Oh tell us please what you’re made of,
Oh tell me please are you in love? Like me…
I say love…

And there’s no one I would rather be with,
Nothing I would rather do,
Cause I’ve got this dream, this heart that beats,
Outside this silent world, and I’ve got you.
We’re falling in the lights of others,
I hold her willed and we keep spinning,
We’re falling in the lights of others,
I guess our mind is made up,
We’re gonna quit the state of,
We can leave this silence…
We can leave this silent… void.
We can leave this silent… void.
We can leave this… void.
We can leave this silent… void.

I say love… I say love…

And there’s no one I would rather be with,
Nothing I would rather do,
Cause I’ve got this dream, this heart that beats,
Outside this silent world, and I’ve got you.
Outside this silent world a heart beats,
Outside this silent world well I’ve got you,
Outside this silent world my heart beats,
Outside this silent world well I’ve got you.

Kissable

Negue que me pertenceu
Que eu mostro a boca molhada
Ainda marcada pelo beijo seu

Maria Bethânia

Amargo

"Estranho é o sono que não te devolve.
Como é estrangeiro o sossego
De quem não espera recado.
Essa sombra como é a alma
De quem já só por dentro se ilumina
E surpreende
E por fora é
Apenas peso de ser tarde. Como é
Amargo não poder guardar-te
Em chão mais próximo do coração."


Daniel Faria

Walk on By



Vem dançar comigo, a tua respiração no meu pescoço. E depois deita-te a meu lado no sofá. Apeteces-me.

Nudez

Qualquer forma de escrito é já uma exposição. Mesmo que seja ficção.

Infância feliz

Brincam dizendo que qualquer dia fundo uma igreja. Não sabem elas que já a tive, com direito a hóstias de pão e tudo, quando Lhe dirigia cartas, a Ele que também se diz Pai dos animais. Pela Lassie, pelo Bigodes, por aquele pássaro. Estávamos a fazer-lhe o velório, o pequeno corpo dentro duma pequena caixa, tapado por um fino napron, em cima do sofá e a rapariga veio e, cega e indiferente ao que de sagrado sucedia naquele local, sentou-se distraída em cima da caixa, no sofá. O avô haveria de estar lá fora a preparar uma cruz improvisada com canas e cordel e ajudar-nos-ia a abrir o buraco para o enterro do pássaro espalmado.

Também não sabem que fundei uma sociedade secreta, que me transformava em Senhor do Grão de Areia, que tinha um cajado mágico e uma mesa que era também um mapa e onde delineávamos estratégias contra os nossos inimigos de morte: os Quinas (a marca dos fósforos), que encontrávamos frequentemente quando íamos com a avó ao pinhal, à caruma e às pinhas.

Qual líder inata, tinha os meus seguidores - o meu irmão e o meu primo - que não raramente eram submetidos ao pior dos castigos do meu reino: o pau dos bicos. E sim, de facto magoavam, mas uma rainha tem de se fazer respeitar. Habitava um trono majestoso, no cimo de toda a lenha acumulada lá fora. Era meu por direito. E escondíamos tesouros valiosos, convencidos de que poderíamos a qualquer momento ser alvo de ataque inimigo. Procurem debaixo da figueira e encontrarão uma pequena caixinha colorida com uma nota de réis e moedas antigas dentro. Terão mais sorte do que nós, que nunca a chegámos a encontrar.

Post Secret

Dói-me que ela não me tenha abraçado naquele dia.

Egoísmo

"O suicídio é um acto de egoísmo."

Mirkito (irmão)

Perfume de Mulher (agora já sabem)

Sou uma pessoa de cheiros. Viro-me de imediato na rua se encontro um perfume agradável. Mexe-me com todos os outros sentidos.

Nos homens, gosto de In Motion by Hugo Boss, 212 by Carolina Herrera, City Glam by Emporio Armani e o perfume do Prof. Luís Rainha (que não sei qual seria);

Nas mulheres, gosto de Paco by Paco Rabanne (o meu, no momento), One by Calvin Klein, Light Blue by Dolce & Gabbana e Gucci by Gucci.

Mas, acima de tudo, Boss Bottled by Hugo Boss. Tira-me do sério. E, é claro, o teu cheiro, naquele sítio mágico onde o cheiro da tua pele se funde com o cheiro do teu cabelo...

Expiação

Nota-lhes a distância (não se preocupam em disfarçá-la), as palavras mudas que mais não são que sílabas consentidas de quem não quer iniciar dada conversa sabendo de antemão que, no final, tudo resulta no mesmo de sempre. Não sabe o porquê, estava distraída demais para o entender. Mas está lá. De novo.

Na altura ela era demasiado ingénua, estupidamente jovem. Ultrapassou todos os limites, confundiu toda a dor que lhe nascia no peito, ignorou o mais importante. (estás feliz agora?) Não suportava mais aquilo. Os telefonemas do amigo de trabalho, os bilhetinhos escondidos, o perfume que ela usava e que ainda hoje lhe provoca náuseas de memória.

Não podia permitir que aquilo continuasse. Como se atrevia ela a viver tão à vontade, tão sem culpa, tão evidente para toda a gente e, só ele cego para ela e para tudo, não via. Então ouviu telefonemas, reuniu provas, morreu por dentro e confrontou-a: contas tu ou conto eu. (estás feliz agora?) O tempo corria ansioso, nervoso, hesitante e preocupado e ela não contou. Teria então de contar ela, que o não queria fazer. A bomba foi obrigada a explodir. Sexta-feira.

Choveram lágrimas, das contidas e das manifestas. Choveram insultos e malas, numa pressa de fugir do escandâlo e dos perigos da raiva. Eles, inocentes, estavam lá, encerrados no quarto e esperançosos de que aquilo passasse. A porta fechou-se. Mas, antes de sair, ela volta-se para a olhar fundo no olhos e pergunta: estás feliz agora? A pergunta que nunca mais poderia apagar da sua vida.

Minutos depois o pai sai também, os olhos vermelhos num conflito de dor, raiva e desprezo. Leva a pistola consigo. Ela está de robe, olha o nada na janela ampla da varanda da sala, sem saber o que fazer. Fica ou vai atrás. Liga para alguém. Para quem? Liga para o pai, que diz que está tudo bem, que vem já. Ouve-lhe a voz de choro nas palavras. Agarra contra si o cão, pega-o ao colo e aperta-o com mais força, os pêlos do cão absorvem as suas lágrimas que jorram incessantes. Diz-lhe em pranto "vai ficar tudo bem, calma". Di-lo para si mesma. Reza também. Reza muito, reza tudo o que sabe, fala-Lhe como nunca fez antes. Aguarda na sala, sentada no sofá. Tem medo, muito medo. Preocupada e com muito medo. Carrega agora o peso da sua consciência. Ela é a culpada daquela situação. Se ela não tivesse dito nada (estás feliz agora?)...

Não dorme, não conseguiria. Sentada no sofá, com o cão ao colo, espera. O pai chega horas depois na madrugada, não diz nada e deita-se. Ela vai deitar-se também, ouve o choro do pai na almofada, o telemóvel que toca constantemente, não dorme e a cabeça parece explodir de tanta dor.

No dia seguinte a família, protecção sempre presente, aparece. O pai continua com a pistola no cinto, indiferente. Não o deixam sozinho, acompanham-no. Acompanham-nos também a eles. A amiga dela telefona mais tarde: conta que ela está lá e que não pára de tremer, treme muito. Depois passa-lhe o telefone e ela pede para falar com ele, só com ele, o menino de sua mãe: queres vir ficar com a mãe? (estás feliz agora?).

Voltou no Domigo à noite. Não houve explicações, não houve conversas. Deitada, ouviu-os a terem sexo, eles não se importaram com o barulho. Ela não entendia e sentia-se enojada com aquilo tudo. Um faz-de-conta, como se nada tivesse sucedido, como se não fossem precisas mais palavras, como quem estala os dedos e recomeça. Durante muitas semanas olhou-a com estranheza, como quem não pertence mais ali, não depois de tudo. Evitava-a. A psicóloga haveria de identificar nela uma qualquer obsessão que conduzira àquele desfecho, um sentido de posse injustificado: a nossa casa, o nosso carro, o nosso camião, a nossa família. Não gostou do que ouviu e nunca mais voltou à psicóloga. Cresceu sozinha e discreta, envergonhada do que sentia: odiava-a. Cada dia teria de ser uma conquista, cada passo uma vontade.

Infelizmente, demorou demasiado tempo a perceber que ela era sua mãe. Hoje, não se pode ainda desculpar (estás feliz agora?) mas não hesita já. Sabe o que importa.

Estranha forma de elogiar

"A culpa é tua: se não fizesses bons cozinhados ele já daria mais valor ao vir almoçar a restaurantes."

Homem-Cueca



How can you mend a broken heart

Aqui.

Tomates

Constatações

Não gosto de ouvir a minha avó dizer "o avô que Deus tem". Demasiado estranho.

Família

Hoje a minha prima liga para casa da minha avó e sou eu quem atende:

Eu: Estou?
Prima: Estou (tom de quem não conheceu a voz). É a S.?
Eu: Não.
Prima: É a G.?
Eu: Não. Com quem é que estou a falar?
Prima: Com a neta.
Eu: Ah. Eu também sou a neta.

E rimos ambas da situação. Assim se percebe que eu e a minha prima não falamos muitas vezes ao telefone.

Encontro-te na eternidade

A minha avó diz-me que o João Padre, também conhecido por Caga-notas, mais de 70 anos, se tentou matar, com veneno. (In)felizmente, o veneno já estava fora da validade. Quando lhe perguntaram o porquê de tão drástico acto respondeu que se sentia sozinho e queria ir para junto da mulher.

Carpe Diem

Ler algo, seja num livro ou num blogue, de alguém que conhecemos pessoalmente não deixa de ter o seu quê de exploração psicológica. Tentamos mais afincadamente descobrir o sentido das suas palavras, certos de que haverão de ter algum sentido, confiantes de que haverá ali algo de auto-biográfico. Sempre fica uma ponta ou outra. Vamos então tentando encaixar as peças, fazendo a ponte com aquilo que sabemos de facto ou que imaginamos. Procuramos o que está por debaixo. Por vezes surpreendemo-nos: a pessoa que lemos não é afinal a mesma que conhecemos. Ou, simplesmente, nunca conhecemos ninguém tão bem quanto julgamos. Pode porém suceder também o contrário, termos noção de que não conhecemos o autor na realidade e, ao ler as suas palavras, verificar que o conhecemos desde sempre, pois reconhece-mo-nos nelas.

"E o seu corpo, juro, tem todas as marcas que o meu tem. Como o sei? Ela conseguiu expô-lo na sua arte, eu vi-o e vi-me. E li tudo o que escreveu, num dia de ânsia, devorei-a como ela jamais poderá imaginar, arranquei toda a sua casca, também sei por onde puxar, e descobri-me, frágil, dentro dela. Cosi-a de novo e afastei-me. Não sei o que fazer agora que me descobri neste corpo.
(...) Até porque, para mais, ela não é apenas eu. É tudo aquilo que eu gostaria de ser. É o meu ser em potência. Tem a força, a arte, o talento, a vida e até o estilo que eu gostava de ter. Sinto-me uma miniatura, uma amostra, um rabisco, um rascunho, um zigoto inviável. Como se tivessem pegado no meu ser e o tivessem plantado noutro corpo (semelhante ao meu) e ele tivesse germinado em força sem a minha vergonha e insuficiência. Odeio-a por ser o que sou e o que não chego a ser."

Casais Improváveis I

Pensando de fora, vejo que também nós fomos um casal improvável. E também nós não nos contentámos, quisemos sempre mais. Arriscámos. Talvez não tudo, é certo, mas o máximo que conseguíamos naquele momento. Mesmo que tudo se perca, valerá ainda e sempre por isso. Porque arriscámos.

Convites, só isso

Presumo que sejas tu. Oiço-te os passos, de quem entra a medo e não quer ser notado. Talvez um interesse que te ficou, porque sei que te preocupas nem que seja minimamente, porque quiçá te resta o mesmo carinho que manterei sempre por ti.

Solto palavras na tua direcção, aquelas que me ficaram por dizer antes, por minha culpa, distracção, ignorância ou simplesmente por ser tarde demais. Por isso voem! Voem agora as minhas palavras sem descansar ou vão com o vento quando estiverem já mais cansadas. Peço-te que não lhes batas com a porta na cara, não depois de tanto trabalho a que se deram para chegar até ti. São palavras simples, nada complicado, nada de interrogações absurdas ou perguntas a precisar de resposta. Essas, já não as procuro. São palavras curtas como "desculpa", "obrigado" ou "sempre". Aceita-as. E se quiseres continua a responder-me com o silêncio. Não me importo, desde que saiba que as palavras chegaram até ti em condições.

E são também convites embrulhados em ternura, em memória da história de que sobram agora as doces memórias. Não, não convites desses, descansa. Estou bem ciente do meu lugar e da noção de tempo e espaço. Também já conheci o amor, lembras-te? Convites inocentes, de quem não deseja mais do que o teu abraço e o teu sorriso, quando fechas os olhos com mais força, como criança feliz. Não quero ser só essa história triste que um dia te angustiou e fez mais claros os teus olhos de choro. Quero continuar a fazer parte do teu riso e do teu sorriso, como amizade com distância recomendada, como pessoa ausente mas que existe para ti, quando me procurares. Por isso, deixa-me fazer-te todos aqueles convites que o tempo não me deixou: Queres ir comer um gelado? Queres ir passear no jardim? Queres ir jogar à bola, correr? Brincar de esconde-esconde? Queres ver uma comédia idiota no cinema e rirmos até doer a barriga? Queres ir nadar no mar? Não precisas de aceitar. Provavelmente não o farias. Mas sente-te convidada. Sempre.

A Gaivota

E esta, por causa do vídeoclip. Finit.

Amália Hoje II (só mais esta)

Porque não deixa de ser engraçado ouvir Fernando Ribeiro (dos Moonspell, pois) a cantar uma Bossa Nova. Só mostra a versatilidade e qualidade do artista.


Amália Hoje I




O Fado nasceu um dia,
quando o vento mal bulia
e o céu o mar prolongava,
na amurada dum veleiro,
no peito dum marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Ai, que lindeza tamanha,
meu chão , meu monte, meu vale,
de folhas, flores, frutas de oiro,
vê se vês terras de Espanha,
areias de Portugal,
olhar ceguinho de choro.

Na boca dum marinheiro
do frágil barco veleiro,
morrendo a canção magoada,
diz o pungir dos desejos
do lábio a queimar de beijos
que beija o ar, e mais nada,
que beija o ar, e mais nada.

Mãe, adeus. Adeus, Maria.
Guarda bem no teu sentido
que aqui te faço uma jura:
que ou te levo à sacristia,
ou foi Deus que foi servido
dar-me no mar sepultura.

Ora eis que embora outro dia,
quando o vento nem bulia
e o céu o mar prolongava,
à proa de outro veleiro
velava outro marinheiro
que, estando triste, cantava,
que, estando triste, cantava.

Amália Hoje

Ontem confirmei, in loco, que Sónia Tavares é, como foi dito, a melhor intérprete portuguesa da actualidade. Ainda se faz muito boa música, e o projecto Hoje é uma prova clara disso. Concerto magnífico, intimista (na Fnac) e daqueles que arrepia.



Não sei, não sabe ninguém
Porque canto fado, neste tom magoado
De dor e de pranto . . .
E neste momento, todo sofrimento
Eu sinto que a alma cá dentro se acalma
Nos versos que canto
Foi Deus, que deu luz aos olhos
Perfumou as rosas, deu ouro ao sol e prata ao luar
Ai, foi Deus que me pôs no peito
Um rosário de penas que vou desfiando e choro a cantar
E pôs as estrelas no céu
Fez o espaço sem fim
Deu luto as andorinhas
Ai . . .deu-me esta voz a mim

Se canto, não sei porque canto
Misto de ternura, saudade, ventura e talvez de amor
Mas sei que cantando
Sinto o mesmo quando, me vem um desgosto
E o pranto no rosto nos deixa melhor
Foi Deus, que deu voz ao vento
Luz no firmamento
E pôs o azul nas ondas do mar
Ai foi Deus, que me pôs no peito
Um rosário de penas que vou desfiando e choro a cantar
Fez o poeta o rouxinol
Pôs no campo o alecrim
Deu flores à primavera ai
E deu-me esta voz a mim


Jantar no Colombo (ouvir as conversas dos outros é feio)

A amiga dela perguntava-lhe a ele porque já não andavam os dois, ele e ela, afinal. Ele responde da reacção dela quando o pai lhe disse "Tens é de fazer a tua vida com alguém da tua cor, ele não é rapaz para ti!". Depois ele contou à amiga dela, a medo, com pena e irritação na voz, que o pai dela batia à mãe dela. Pois aí estava, ele sim, pai e senhor de toda a razão, ele sim era homem para alguém. Mas ele não era rapaz para ela porque era preto.

Catarina


Wallenstein.

Casais Improváveis

Gosto de casais improváveis. Prefiro-os até aos casais perfeitos que serão sempre mais entediantes, mais limitados na sua semelhança de gémeos siameses que não se deslargam. Um casal improvável é uma Barbie que não quis um Ken, um menino rico que se apaixona pela empregada moldava e iletrada do pai, um actor famoso pelo seu corpo perfeito que cai de amores pela vizinha gorda, Romeus e Julietas que assim vão desafiam os (pre)conceitos e regras idiotas da sociedade. Nestes casais parece-me sempre haver mais verdade, daquelas verdades despojadas de razões, verdades que o são porque provêm do âmago daqueles amantes improváveis, porque tiveram a disponibilidade e a vontade para verem. Além de.

Ontem encontrei um desses casais a assistir ao concerto. Olho-os como se olha coisa fantástica e tantas vezes irreal, como se na minha ignorância e incredulidade tentasse descobrir uma prova que os denunciasse, uma razão não facilmente perceptível mas capaz de explicar porque é que uma rapariga como aquela escolheu um rapaz como aquele.

Ambos são jovens. Ela é loira ou daquele moreno muito claro, tem um rosto bonito que inspira uma serenidade imediata, uns olhos grandes que um dia o viram a ele e uma boca apetecível de vermelha, que lhe confere uma sensualidade inesperada em tanta paz. Parece uma Catarina Wallenstein. Talvez se chame Catarina ou Ana ou Maria ou Laura, um nome assim, simples, sem outros nomes a acompanhar porque se basta já naquele que é. Não tem um corpo magrinho, não é o corpo perfeito que os media tentam impingir, mas também não é aquilo que se chama de gorda. Tem curvas de mulher Eva, que sabe realçar na roupa que escolhe habitualmente para vestir. É alta e traz um vestido branco, justo, que lhe assenta de um modo divino, e que ela escolheu porque sabe que lhe fica bem. Fica-lhe um pouco acima dos joelhos, limite imposto à imaginação mas que esta salta sem dificuldades maiores, e dá-lhe um decote na medida certa, aquela que não mostra tudo mas mostra o necessário, aquilo que no fundo medeia um decote ordinário e gratuito e um decote decente e sensual. É um vestido sem mangas, sem qualquer estampado ou outra cor senão o branco. Os sapatos vermelhos compõe o quadro - parece uma Dorothy saída de Oz, uma Lolita ou uma daquelas fadas que se passeiam nos bosques mais verdes dos teus sonhos.

Ele é magro e de aspecto fraquinho. Também alto, usa uns óculos pequenos e rectangulares que, em conjunto com os pêlos que se dispersam livremente pelo seu queixo, lhe dão um aspecto geek. Pende-lhe da cabeça um cabelo escuro, grande, cheio de caracóis e que lhe vai caindo para os olhos. Poder-se-ia facilmente supor que está a tirar uma qualquer engenharia informática, que combine com os seus dedos longos e frágeis. Não é o tradicional tipo bonito. Veste umas calças de ganga escura e uma t-shirt preta, onde sobressai a branco "Nine Inch Nails" (atrás de mim, um jovem irritante e que não se cala comenta com a namorada que, pelo nome, deve tratar-se de um grupo alemão). Arrisco dizer que lê BD, Nietzsche também. Parece um jovem despreocupado, sem drama maior do que a feia borbulha que lhe aparecerá no nariz.

Repare-se então: ela, de uma beleza invulgar sem ser evidente, atraente sem dúvida, cobiçada certamente; ele, de uma fragilidade que desponta ao primeiro olhar, hesitante na sua manifestação de ser. Nasce-me uma curiosidade premente e inevitável - pergunto-me do como e do porquê, ignorante de mim que tenho de achar ali uma razão.


E o curioso de tudo, contrário ao que seria de esperar, é que é ela quem constantemente o puxa para si, lhe conta segredos ao ouvido e aproveita para lhe mordiscar a orelha. É ela quem lhe mete as mãos nos bolsos de trás das calças e o procura para um desejado beijo. É também ela quem brinca com os caracóis dele, em traquinas voltas com os dedos. É ela que o deseja. E, em tudo isto, ele parece despreocupado, quase ausente, e responde aos seus beijos sem determinação ou aparente vontade.

Até no seu comportamento este é um casal improvável.

Chop Suey

E, porque uma coisa puxa a outra, aí fica a minha música de SOAD preferida. Enjoy.

When I'm around you

Eliza Dushku (Tru Calling)




Gosto muito desta série (que está a passar na tv no momento em que escrevo). :)



Tão natural como as flores (be patient)

"Não quero esconder-me nunca mais, de nada, de ninguém. E sei muito bem que tenho de fingir. E nem é só por ser mulher. É porque ainda não chegou para todos o tempo das verdades que queimam e curam, que hão-de ser tão naturais como as flores, não as das jarras, mas as outras, as que desabrocham e morrem, naturalmente, no cristal de Abril, muito simplesmente, sorrindo ao sol e ao Sul de uma felicidade de repente tão brilhante como as escamas dos peixes.
(...) Temos de atravessar ainda cidades e pessoas, prisões que hão-de explodir, certames de clítoris libertos, sebes como lâminas agudas, que havemos de colher e empacotar, para efeito de catalogação; e forçoso nos será andarmos sobre rochas, à beira-mar, à beira-útero, sobre pontas de diamante e pólipos vermelhos, com corrimento...
Algum dia, acredita, tornaremos a encontrar-nos e então completamente nus, tanto quando poderão está-lo, frente a frente, um homem e uma mulher.
Será preferível saber? assumirmo-nos totalmente?
Penso que será diferente meu amor."

Urbano Tavares Rodrigues,
Fuga Imóvel

Insalubre

"(...) Já não importa muito o que faças, o que digas, quero-te como eu te faço.
E talvez isto seja insalubre. Talvez."

Urbano Tavares Rodrigues,
Fuga Imóvel

Corres-me no sangue, sinto-te na língua

"Em mim há todas as contradições - e só assim se explica que te deseje com este excesso que a distância torna em ferida e ao mesmo tempo com todo o amor e ódio de todos os homens por todas as mulheres, amor feito desta intensa espera de te penetrar e redescobrir, mas também de angústia, receio do definitivo; de infinita ternura, mas também de pânico, ou do espanto da abertura para a morte que é aniquilação no outro.
Agora posso dizer-te, agora sim, como te quero. Corres-me no sangue, sinto-te na língua, nas mãos, no sexo, no cheiro, nas contracções do estômago, no tremor de todo o corpo, arredondas-te na noite que me envolve, reconheço-te até no tempo em que não te conhecia, na aspereza dos chaparros e no seu drama, na lua-cheia de Outono, cor de laranja, nas folhas pisadas como as tuas pálpebras, sinais de ausência, lareira de veludo (tão longe!) montanha em chaga que não se deixa escalar."

Urbano Tavares Rodrigues,
Fuga Imóvel