Ela é todos os invernos adiante.

Tu ainda não acreditas, mas garanto-te que podíamos fazer isto. Se tu quisesses, conseguíamos. Repara como o que te proponho vai além do meu romantismo e até dos sonhos perfeitos que outrora guardámos. Também sei ser racional e pragmática e, se tu quisesses, isto funcionaria. Numa insuspeita arquitectura dos acasos, convergimos para o mesmo tempo e espaço e todas as estrelas mo confirmam. É um sinal, amor. Vamos amealhando dinheiros e esperanças. Eu começava as obras, tu os filhos, arrumávamos a vida. Um casal numa casa. Pensa nisso.

Quando eu chegasse do trabalho, notaria aquele cheiro novo que se fez de nós. Um cheiro a família. As especiarias e os armários da cozinha estão arrumados ao teu jeito, a planetária naquele canto. Trouxe um livro novo para colocar na biblioteca, onde começa já a faltar-nos o espaço. A Celeste, o Joaquim, entretêm-se a brincar com o camião dos bombeiros que os teus pais deram pelo Natal. O gato continua a deixar pêlos por todo o lado. A ver se não nos esquecemos de comprar pesto verde quando formos ao supermercado. Tu cozinhas, claro, e questionas o meu perfume e o arranjo, como se fôssemos das novelas. Ralhas-me porque sou mole e porque não te dou valor quando passas a manhã a cozinhar. Ralhas-me porque não queres que te agarre enquanto estás de avental ao fogão e não te apetecem beijos àquela hora. Ralhas-me porque quero comer doces antes das refeições. Ralhas-me quando me distraio no computador e não vou logo comer quando chamas. Ralhas-me tanto e eu adoro-te tanto e é por isso que te beijo mais uma vez para que não me ralhes mais. Não deixo que te esqueças que a felicidade é coisa simples.

Podíamos ser nós, garanto-te. Não seria só uma ideia fixe para ti. E quando nos deitássemos no mesmo abraço, os miúdos deitados e ajustada já a temperatura dos corpos, nos dias em que eu não adormecesse enquanto víamos as nossas séries, eu haveria de queixar-me que agora era sempre na cama e debaixo dos lençóis e tu haverias de dizer-me que a vida muda e que não pode ser forrobodó todos os dias.

Dás-me a cara, dou-te a boca, e quando anoitece e os teus olhos são o embalo do meu sono, seríamos, eu e tu, um casal numa casa.

Talvez até fosse vantajoso para o IRS.

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