Dois temas são-lhe suficientes para ocupar todo o trajecto, permitindo assim uma análise que tem tanto de relevância e profundidade como de autenticidade e pragmatismo. Nem seriam precisas entrevistas semi-estruturadas para o levar à fonte que, a este, para o bem e para o mal, Deus não o criou calado. Entre sonoros arrotos, "cala-me mas é a miúda que 'tou com uma puta dor de cabeça da puta da vodka de ontem", e "'tás com mijo na rata, filha?", começa.
Primeiramente, a cunhada. Não a de Lisboa mas, a outra que "tá chê da guita". A trabalhar na Bélgica, a comprar camarões dos grandes que não são cá daqueles como os que ele compra no Intermarché, mas que consegue ser tão unhas de fome que só deu cinco euros à miúda, a puta. Pela via das dúvidas, esclareçamos que, por puta, estaria a referir-se à cunhada.
Depois, o cabaz de natal da fábrica. Há que ir tratar disso mal o expresso chegue à rodoviária e o cheiro a Fialho nos lembre do amor a esta terra, verdadeiro fruto do mar, embora mesmo no caso dos frutos do mar, sempre haja uns mais podres que outros. Parece que este ano estão armados em esquisitos e já nem a porra dum espumante dão. Cambada, ali a encherem-se de dinheiro à conta dele, e só sabem mandar uns chocolates, umas postas de bacalhau que nem sequer vem demolhado, um ananás dos Açores, uns biscoitos. Menos mal que inclui também duas garrafas de azeite, que o azeite está caro, azeite é ouro!, mas, porra, o espumante. Liga à Sónia para confirmar se traz espumante ou não.
Arrumado o mal-dizer, desfeitas as confusões com a bata da Sónia que ele levou por engano para casa, refastela-se no assento e conclui: "era ir agora comprar uma Coca-cola de litro e fechar-me em casa a fazer nenhum."
(uma nota de 50 deixada no chão do autocarro e o cabrão viu-a primeiro que eu. É Natal.)
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