Nessa altura eu ainda não sabia nada. Era tudo tão novo, aquela excitação febril e adolescente quase doente dos apaixonados, e eu pensava que eras comum. Tentei impressionar-te com a cultura, mas nessa altura eu ainda não sabia nada. Tu não te lembras. Foi em Lisboa, no Largo da Trindade, perto daquele restaurante em que haveríamos de jantar muitos anos mais tarde, não sabendo à data que o amor era coisa de durar assim. Eu, pelo menos, nunca o suspeitei. Nem do jantar. Tinha o CD do Charles Aznavour no carro e pus a tocar, demasiado alto, claro está, como ainda a oiço hoje, agora, a minha música preferida dele, La Boheme. A mão embala a palavra, o gesto repete-se. E terei certamente olhado para ti, provavelmente sorrido, provavelmente batido os dedos no volante, como faço, como sinto falta de fazer, agora que pouco conduzo. Provavelmente embriagada no ritmo em crescendo, os olhos fechados por um segundo, distraída de tudo o que não fôssemos ali em nós. Travei a fundo e quase bati no carro da frente. Eu ainda não sabia nada, eu sabia tão pouco. O Charles Aznavour morreu e foi isto que me deixou. É apenas isto o que sei dele. O medo e o amor sempre juntos. Sempre o medo e o amor.
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