Não sei há quanto tempo não nos víamos. Talvez fossem sete, talvez fossem dez anos ou mais. Primeiro houve o desconforto de não saber o que dizer. Depois houve o desconforto de percebermos que não havia nada para ser dito. Restou-nos o trivial. Disse que eu estava igual, e pareceu-me igual também ela.
Toda a gente sabia das gémeas, desafio dos professores, inquietação para quem não lhes caísse nas boas graças. Foram da minha turma, chegaram a ser minhas amigas. A Dora era a mais burra e, não sendo a mais instigadora, era quem mais problemas causava. Na secundária, nas aulas de Métodos Quantitativos, enquanto a professora escrevia no quadro, chamava o Paulinho, levantava o top e mostrava-lhe as mamas. O Paulinho ficava com um riso envergonhado e o resto da turma ria-se do riso envergonhado do Paulinho e louvava a Dora como maluca ou como heroína, na maioria das vezes, sinónimos. De certa forma, as mamas da Dora eram um activo público da turma, a que recorríamos quando estávamos aborrecidos com a importância fundamental da distinção entre um balanço e uma demonstração de resultados ou quando as economias em vias de desenvolvimento pediam uma explicação.
Não se sabe o que teria acontecido à roda da vida se a Dora existisse no sétimo ano, pois uma Dora e um Carlitos juntos, já se sabe, tem potencial. Não tendo mamas, o Carlitos batia punhetas no meio da aula de Matemática e, no entretanto do afazer, chamava as mais incautas para que lhe dessem atenção. Era um rapaz cheio de pressa de ser homem.
Conjurações à parte, o que é certo é que encontrei a Dora. Tem uma vida descomplicada, é mãe e está feliz. Trabalha como caixa dum minimercado de bairro, com horários longos mas que lhe permitem estar de folga ao fim-de-semana, quando pode passar mais tempo com a filha. Babada, tirou o telemóvel do bolso para mostrar-me uma fotografia. Tive inveja dela e comprei o meu primeiro creme anti-rugas.
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