Por todas as vezes anunciei uma despedida. Inevitabilidade, decisão, lamento ou redenção. A todas atribuí motivo, quando o motivo sempre foste tu. Dizer afinal seria perjúrio. Afinal, sempre o soube. Anos primeiros, anos depois, anos-eternidade. Quanto tempo vai de mim a ti? Da palavra original até este instante? O tempo, com a paciência que cabe aos omniscientes, sempre me enganou. Ainda não, ainda não. Há o espectáculo da vida, o inesperado de sermos gente e o milagre das ressurreições impossíveis. Talvez sejam os sentimentos o que existe de mais livre, pássaros felizes que o tecto do céu não detém se é infinito. Minha happybird. Nenhum sentimento se fez para as despedidas. Por isso, nunca nos despedimos.
Não será ainda hoje.
E, porém, nós sabemos. A vizinha do 2º L, lá para os lados do coração, esqueceu-se da chave do lado de dentro da porta e o condomínio foi p’ra obras. Há um certo consolo no que se conhece. Não te sei as linhas da mão mas sei-te portas e janelas, o que é de abrir e o que são portas de fechar. Sei quais os erros de Português que te pertencem. Assim creio, espero e amo, pelos séculos dos séculos, ámen. Chegamos tarde ao entendimento dos corpos, dessincronizado do peito. Uma cama pode ser um País e o dinheiro pode ser um empecilho. O corpo tem razões que a razão não augura e não passa ainda um dia em que afaste da memória o toque da boca. É no imediato da vista que o confirmo. Nunca o saberei fazer. A vontade é aquela besta que dá cabo do desejo, interesseira e cega de egoísmo. Perdoa-me a vontade.
Aos poucos, a vida faz-se. São histórias e cruzamentos, o futuro aqui tão perto. Durante muito tempo não voltarei a este lugar. O café mudou até já de nome e os empregados já não correm a endireitar os talheres numa precisão geométrica. Estamos à tangente do novo. Não sei quanto mais me aguentarei no comboio. Quero ser leve e nem sempre consigo. Depende tanto de nós mas não apenas de nós. Em breve, como no poema, as tuas pernas serão coisas úteis, andantes. Bem sei que não faz mal, que é normal. O tempo não se prende, não se esgota, não se acaba. Tudo isto aprendi contigo. Já passou, já passou.
Na despedida, hoje como todas as vezes, se partires, terei saudades. E, se ficares, terei saudades. Promete-me que não se inventará ainda o tele-transporte.
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