Bicho estranho

És bicho estranho, denso e complexo. Bicho cheio de contradições, sem espécie definida, sem género onde assentar. Nem mulher nem homem, nem velha nem nova, nem grande ou pequena, branca ou preta. Não pertences a lugar nenhum, não tens tempo onde crescer, laços que te prendam, nada por que chorar. És bicho que não chega a ser animal. Vives no impulso da loucura, no grito surdo e violento do instinto, que também é sexo e poder e glória. No descontrolo do momento em que te vens e calá-lo não adianta porque já é. Furacão destrutivo que só tu vês ainda, suicída sem razões mais do que viver, sorves a vida até à última migalha esfarelada de seres e se estiveres no fundo de ti, até aí és tu. Até no pó difuso e irreconhecível que serás, também aí és, inteira. Mas não deixas de ser só bicho, sem nada de espectacular para exibir, sem garantias de futuro que semeando deixes, bicho reduzido só àquilo que é. Nada. A tua maior ambição - ser humana.

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