Chamar(-te) Amor

Nunca to disse porque não era suposto, porque havia expectativas a cumprir e que eu não queria defraudar. Antes de ti nunca chamei "amor" a ninguém. Pelo contrário, irritava-me ouvi-lo nas bocas de casalinhos-apaixonadinhos cutxi-cutxi (sempre os diminutivos, não fofos mas fofinhos, obviamente), pior até se fosse "amorzinho". Quando te chamei "amor" a primeira vez senti-me a vacilar e entrar em território desconhecido. Antes de ti nunca chamei "amor" a ninguém. Depois habituei-me, gostei, chamava-te orgulhosamente e sem precisar de razões "amor", por tudo e por nada "amor". Meu. Quase me esqueci do teu nome, passaste a ser apenas "amor", nos meus chamados, nas minhas rezas, nas vezes em que gritei de dor ou prazer, eras apenas e só tu, "amor". Chegaste até a reclamar comigo por te chamar "amor" em público, e então eu começava "a..." e tu olhavas-me e eu chamava o teu nome, no seguimento do "a" e sorria enquanto me corrigia. Agora não te chamo mais, mas instintivamente, como ontem, quando vejo inesperada a tua fotografia, na minha cabeça solta-se "amor", como se não houvesse outro nome para ti senão aquele. Para mim, o teu nome próprio há muito tempo é "amor". É que, antes de ti, nunca chamei "amor" a ninguém.


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