Confiar na Medicina

Dizes-me "confia na Medicina" e, por mais que veja aí toda a tua dedicação e fé àquilo que amas e que vive em ti, mesmo notando a tua preocupação sincera, só não te respondi porque não fui capaz. Confio na Medicina com o mesmo à-vontade com que confio numa tesoura afiada, útil mas também eficazmente danosa. Não me julgues ingrata, por favor. Sou só uma leiga a quem não interessa todos os nomes complicados e os processos imprevisíveis mas apenas os resultados simples e visíveis.

Quando me disseste "confia na Medicina" não pude deixar de lembrar de imediato do avô. Poucas pessoas na família o confessaram mas sei que todas o pensaram, até eu. Talvez tivesse sido melhor se fosse diferente. Era inevitável, sei que sim, já me explicaste da complexidade e da pouca probabilidade que existia, mas seria diferente. Em todos a suspeita inútil de que o tratamento foi mais rapidamente mortal do que a doença, talvez mais benéfico até em dada perspectiva, mas no tempo que lhe/nos roubou foi cruel e impiedoso, e estupidamente certeiro: um mês.

Falas-me da confiança e não a consigo ter enquanto tudo for experiência, cobaia, vamos ver o que acontece; sei que teria obrigatoriamente de ser diferente neste caso mas como estar tranquila se tudo é hipótese, se nada é garantido, se todos parecem tão perdidos quanto eu, talvez apenas num disfarce mais credível por debaixo da bata branca?
Confio na Medicina como solução mais admissível mas confio mais em ti. Confio quando me dizes que vai ficar tudo bem e agradeço-te num abraço forte e sentido que já tenho saudades de partilhar contigo. Obrigada por estares perto, minha querida.