Into the Wild, de chinelas nos pés


No dia em que ela disse que bastava umas chinelas nos pés viste o filme e precisaste de o dissecar com uma esgotante urgência. Era ele ou tu. Make your bets. Assusta-te, preocupa-te, surpreende-te, quê? É um risco muito grande pensar diferente, sobretudo sem a fortaleza da credibilidade para assentar os pés. Estás a todo o momento a provar(-te) e nunca basta.


Não sabes se foi uma questão de evolução, de transição ou de previsível desilusão mas sabes que agora te parece simplesmente ridículo senão estúpido mas noutro tempo não o teria sido. Poderias ter acreditado em tudo, sim havia essa possibilidade larga, mas agora percebes a realidade como diferente da ficção, e, se uma porta no Metro te move, ainda assim não tem a grandiosidade de quem corre para não perder o voo de um amor, ou do amor. Talvez mais cega ainda mas custa acreditar nas chinelas e, entre loucos e sonhadores, tendes mais para a loucura. Não contrariar a realidade mas antes inventar uma nova.


E se noutro tempo ficarias fascinada, hoje tudo aquilo te parece um acto de egoísmo ou ingenuidade adolescente de quem se quer mostrar à força diferente e detentor de verdade. Não acreditas em verdades únicas. Um destino demasiado poetizado. Uma rebeldia como missão superior e última de vida que mais não te parece que uma fuga, afinal. Selvagem e natural mas inclusive na irracionalidade de quem se toma imortal. Até o desafio da morte exige humildade. No limite sim mas tão longe e tão demorado para concluir que a felicidade só é real se partilhada.

Mas há quem chame coragem. E heroísmo. E filosofia. A ti, estranhamente, pareceu-te estupidez e uma excelente banda sonora. A realidade não teve aquela banda sonora.

Mas tu também duvidas das chinelas e continuas religiosamente a jogar no Euromilhões todas as semanas, logo. Make your bets.

2 comentários:

I disse...

Eu pensei exactamente o mesmo. Egoísmo e até estupidez...basta ver a história verdadeira que inspirou o filme.

Marisa disse...

A sério? :) Será que há mais pessoas a pensar o mesmo? Duvido.