O dia em que não desviei o olhar

Poderia ser um estripador, um ladrão, um bêbedo ou só um maluco. Vi-o a aproximar-se e caminhar na nossa direcção, sozinhas no escuro, e o coração não se alterou. Ao seu olá respondi olá. Depois não largou o meu olhar durante segundos que pareceram infindáveis e o coração não se alterou. Não desviei o olhar ou, como disse a minha colega, fiz-lhe braço de ferro. Dez, talvez mais segundos. Fiz-lhe até um gesto com a cabeça para o incentivar a falar, que repetiu, e continuou a olhar-me. Depois disse finalmente: "eu sou um estudioso do comportamento humano. Vocês não me provocam nenhum impacto mas...tu tens personalidade". A boleia chegou e apressei-me a dizer-lhe obrigada e a desejar um feliz natal, que retribuiu. E não sei se foi da noite bebida ou da verdadeira ausência de medo mas este terá sido porventura o primeiro dia em que não desviei o olhar e isso fez-me o dia. Parece que tenho personalidade.

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