A cama 1.

Responde que não gosta de gente coitadinha e conta a história da vizinha que fica curada com aspirinas a pensar que são outra coisa. Não são poucas as vezes em que eu preferi que ela gostasse de gente coitadinha só para que eu tivesse a certeza. Há sempre pior, naturalmente, mas interessa-me pouco, só esta é a minha. Magoam-me os dias da espera  sem sabermos o que esperamos e a sua resistência impressiona-me e orgulha-me na mesma medida em que me desespera. Chega a dar-nos conselhos cheios de sabedoria, porque só troçando poderia distrair aquele pensamento. Não sei se ela tem medo de morrer ou se já o perdeu há muito tempo. Diz-nos, por exemplo, que, se pudermos escolher, que escolhamos a cama 1 porque é a que tem a melhor vista e dá para ver se há ou não visitas, quem chega e quem parte. Se houver algum problema, é também a melhor cama para se fugir, como daquela vez em que ela foi num instante a casa só para fazer o jantar e pediu ao meu pai para a levar rapidamente de volta antes que alguém percebesse. Já as camas 7 e 8 são camas de transição, nunca se sabe se para melhor ou para pior, é esperar para ver. Rio-me e respondo-lhe que deveria escrever um livro, algo que fosse de utilidade também para os outros. Rio-me, é a única coisa em que ela me deixa acompanhá-la. 

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