I don't want to fall for you (my precious).

Se tivesse sido noutro momento o impacto teria sido certamente diferente mas eu tinha acabado de ler aquilo no dia anterior e aquilo ficara a remoer-me na cabeça durante um bocado, estava fresco. "Amo-te", dizia, era uma expressão desesperada e era necessária uma certa coragem para se mostrar tanto desespero a alguém. Seria como um último recurso ou uma nudez de que ela se pudesse envergonhar. E isto nem tinha a ver com a sua condição de palavra íntima que se deve poupar reservada ou com a importante necessidade da certeza, não era sequer isso. No meu entender, sempre tão pouco, era ser aquela expressão como uma ferida exposta, a vulnerabilidade finalmente à vista, uma súplica final, eu a pedir que nunca me deixasses fosse ainda o nosso tempo. Aquela palavra tinha tanto de primeira como de última, tanto de entrega como de responsabilidade. Tanto como dar sem esperar receber tem de virtude e de ingenuidade. Não era uma palavra fácil. Não o devia ser e, contraditoriamente, era uma dificuldade que era necessidade cheia de vontade, como quem pare filhos. Eu pensava isto e pensava nela, a que não precisa de hífen porque é contínua em mim.

Quando enfim chega o momento em que já não nos contemos só em nós, já não há nada que possamos fazer, nada senão ceder. Cedemos sempre. Talvez a única solução que nos reste não chegue a ser uma solução mas um artíficio. Há quem ceda e fique, há quem ceda e fuja. Quando partiu, o momento foi inesperado mas o gesto não. Cedia, partindo. 

Por isso quando o telemóvel deu sinal, o contexto outro, parei abruptamente a olhar para aquilo, sem saber bem o que dizer ou sentir. Até mesmo agora, enquanto escrevo. Substituí então os sentimentos sérios por piadas parvas, o Senhor dos Anéis pelo Harry Potter, não por que lhes procurasse retirasse importância mas porque sei cada vez menos lidar com essas coisas sérias. Foi algo que me ficou como protecção ou como defeito, mas tu sabes e não te importas. Conheces-me. Dos amores, são todos eles utilitários, faz parte. A diferença é que nós damos-lhe boa utilidade e basta isso para que este amor seja verdade.

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