Como é que eu estou certa que é a coisa certa e que esta porta já não pode ser aberta.

Nunca pensei que te fosse encontrar tão bonita. De cada vez, penso que já não posso regressar, penso que já não podes ser tecto que me abrigue e que não és mais do que uma memória estável dos meus sentimentos mais saudosos, tudo o que se perdeu ou, melhor, acabou. Quando me falam de saudade é também o teu nome que oiço. Mais do que uma vez, deixei-te com a convicção triste de ser o fim e obriguei-me a olhar-te de frente, como se faz nas despedidas. Nunca quis que fosse assim.

Se tivesses uma vida que fosse só tua, talvez pudesses saber que nunca esperei conhecer-te. Nunca fizeste parte dos meus planos, nunca imaginei conseguir localizar-te neste emaranhado de estradas e atalhos. É verdade que toda a gente diz estas coisas, seja mais tarde ou mais cedo, mas talvez os clichés existam por um válido motivo. Se me perguntassem, serias uma ambiguidade ou um mistério, aquele género de histórias que se ouvem na infância mas que não sabemos ainda decifrar, eu a contar-te onde fica a Índia, por exemplo. “Há tantos caminhos”, repete ela.

Apareceste então, inesperada, entre os meus caminhos e dou por mim agora a pensar em ti mais do que seria concebível, ainda que não saiba bem se é por ti ou por quem me fazes lembrar, como se diz de quem ama o amor e não o ser amado. À vista pequena, encontrar-te é sempre uma excentricidade. És a desconhecida de que me ouvem falar, sem conhecerem mais do que lhes mostro e, se não houvessem provas concretas com cheiro de terra e de mar, poderiam achar que és feita de imaginação e vontade. Digo-lhes que és diferente e pronuncio devagar o teu nome de mulher só para te dizer mais bela. Gostava que alguém escrevesse sobre ti um dia. Que dissessem de ti de como és puta e rainha e a mais bonita que já se viu. Que te desejassem, percorressem e depois te deixassem em paz, deitada à tua luz própria de ser uma jóia em que poucos reparam. Gostava que alguém se apaixonasse por ti perdidamente.

Sei eu tão pouco de ti, também. Se vivesse contigo é bem provável que tudo fosse diferente, deixava-te em três tempos e sem precisar de saber que tempos são esses, se verbais ou dos ponteiros do relógio. É que há coisas que não são exigidas mas são esperadas e é certo que a memória que me fizeste tem tanto de dor como de riso. Nos dias em que o meu ânimo é leve, porém, fugia para dentro de ti, viveria contigo, e depois o futuro haveria de se arranjar, como sempre sucede e sem precisar de mais ajudas. Hoje apareceria aí só para me lembrar do quanto és bonita.

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