Somos um País de cidadãos não-praticantes.

Preferíamos o intelectualismo vazio, mesmo aquele que não entendêssemos, ao coloquialismo de café, mesmo que tenha mais textura e gosto. Eleitos pelo povo e para o povo mas, dentre o povo, isso é que não, valha-nos deus!

Não aceitaríamos a boçalidade de um agricultor, o jeito tosco de um pedreiro ou o discurso bacoco de uma doméstica. São todos muito precisos e valiosos, sim senhora, tudo certo, mas também não era caso para pensarmos agora que nos poderiam representar. Estimamo-los muito, com certeza, mas não são para ser exibidos, há que respeitar o lugar de cada um, como veio nas notícias no outro dia sobre o hospital que escondeu o empregado aleijado quando o cortejo oficial das pessoas importantes lá foram. É do conhecimento geral, bom senso até, o facto de haver roupa destinada a andar por casa e a outra que é roupa de sair ao Domingo.

Precisamos muito de alguém que seja melhor do que nós, que tenha estudado, que saiba falar bem, falar estrangeiro até, que seja de bom trato e de bom nome, que não tenha os nossos vícios sujos, desconhecedor de putas - perdão, prostitutas - e vinho verde. Precisamos muito de alguém a quem chamar sr. doutor e sr. engenheiro. O que seria deste País sem os nossos doutores e engenheiros, o que seria de nós se nada nos distinguisse as categorias sociais? Nós sem um amo para servir e de repente todos iguais, onde é que já se viu.

Para os Portugueses, o parlamento não é, por isso, um lugar onde se vejam representados mas é, sim, o lugar onde se vêem elevados. Aquele não é o lugar do povo, que não é sequer digno de aspirar a tanto, mas dos eleitos, os que passaram em todos os testes e preencheram todos os requisitos. Ali, os nossos melhores, os mais perfeitos dentre todos nós, os sacanas duns sortudos a mamar do nosso dinheiro, todos de volta do tacho, todos ladrões e palhaços, aqueles cabrões que foram mais espertos do que nós.

Para os Portugueses, muitos desconhecedores até aqui do nome do ministro da economia, aquele discurso de Pires de Lima foi um triste espectáculo, nós a pagar para aquilo. A lamentar, porque nem todas as verdades são para dizer em voz alta, assim a interromper a serenidade das sessões plenárias que os Portugueses sempre vêem com tanta atenção, encantados da eloquência que por lá jorra.

Porque para nós, Portugueses, a política é coisa só para os políticos, só para quem está à altura, não é para nós, e já vão com sorte se formos votar, nós que temos sempre tanta coisa mais importante para fazer. Que Pires de Lima tivesse descido ao nível do povo, ignorando o seu papel imaculado e iluminado de político, usando palavras como "taxinhas" ou fazendo comparações a ketchup e aos ataques do Cristiano Ronaldo, era por isso inadmissível. Toda a gente sabe que os políticos só podem ser do povo quando em campanha eleitorial.

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