Ao largo de uma curva não há nada excepto precipício.

Resume-se a isto. Estamos todos partidos. De maneiras diferentes, por razões diferentes, uns mais do que outros, mas nisso todos iguais. Partidos. É isto o que somos. São histórias interrompidas, despedidas precipitadas, guerras, palavras que não voltam, pessoas que não voltam, injustiças e opressões, mentiras e cobardias, deficiências, insuficiências, o amor que se resolveu antes do tempo, o amor que não se resolveu, o amor bruto, o amor morto, o amor excessivo, a falta de amor. Se olharmos bem, vai tudo dar lá, uma espécie de amor. Nisso somos todos iguais. Somos todos a mesma fragilidade em surdina. Dores menores dentro de dores maiores, encaixadas como matrioskas. Mas há verdade nas frases feitas, a vida continua e um dia mau não faz uma vida má. Ela tem razão quando diz que nem o rio pára. Ela tem sempre razão e diz sempre melhor do que eu. O comboio ainda em andamento porque o caminho é em frente. Sabemos disso, a inevitabilidade de continuar é tão grave quanto a inevitabilidade de lembrar, e as coisas são como são. As coisas são como são.

Não foi para isto que fomos feitos. Não fomos feitos para a dor. Fomos feitos para o sol e gargalhadas e abraços e beijos. Somamos cada dia até que a espera seja conforto e que os hábitos se adaptem. Está-nos na condição de sermos humanos, não desistir, acreditar. Resistimos, lutamos, apanhamos os destroços do chão e recompomo-nos. Fazemo-nos homens e mulheres. Sobrevivemos à felicidade. Sobrevivemos para a felicidade.

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