Diremos que se tratou de um incidente feliz. You are a fortunate accident. Pronto, já passou. Há momentos assim. No último minuto, cedemos ao rescaldo e deixamos que a vida nos lembre, largamos a razão e vamos porque podemos ir, que se foda. É do que mais gosto, quando finalmente cedes. Reparaste como foi fácil o riso, fluente a vontade?
A verdade é que não estamos habituados a dizer os sentimentos em voz alta. Fui, por isso, tão surpresa na forma como no conteúdo, tanto no gesto como na palavra. As nossas vulnerabilidades são permeáveis. Tocam-se, conhecem-se, misturam-se. Sei o teu medo mas não me mete medo. É um elemento decorativo que convém não perder de vista, claro, importante para que nos mantenhamos alerta. Afinal, já cruzámos todos os caminhos possíveis, já testámos todos os tempos verbais. Não há para onde irmos e há nisso a beleza de podemos ir agora aonde quisermos, sem passado e sem futuro. Diz a palavra e deixa arder.
Além do mais, foste quem me falou do ridículo de se amar muito, o contraditório de se medir o que não é de medir. Mesmo a canção é uma falácia: os sentimentos, como a identidade, são pessoais e intransmissíveis. Existem por si, bastam-se por si. Não sei por isso o quanto gosto de ti, se é pouco ou se é demasiado. Não sei sequer se isso importa. Já tu, parece-me, gostas demasiado de mim. Tanto, ao ponto de quereres proteger-me.
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