Devaneios de um dia de chuva

Podemos convencermo-nos de tudo. Basta que acreditemos muito. Pensava que já me eras indiferente. Preferia tanto que sim. Ontem, de uma maneira muito cruel, mostraste-me que não.
Falaste-me de intimidades reveladas, partilha de histórias. Relembraste aquela noite de Carnaval, a primeira de muitas e a que se tornou a mais inesquecível de todas, aquela em que no fim, te beijei a boca, a ti perfeito desconhecido. Perguntaste se eu me lembrava. Mas como posso esquecer? Depois fizeste questão de me mostrar que te lembravas até da primeira correcção que te fiz (eu, e a minha mania de tentar corrigir os outros!). Diz-se "pulverizar", não "pruvizar".

Ontem disseste que, apesar de tudo o que aconteceu, nunca tinhas deixado de me tratar com amor e carinho. Disseste que na altura fizeste tudo para que eu me sentisse amada e desejada. Disseste que histórias como a nossa não acabam assim, nunca acabam. Tal como nos momentos do prazer, também ontem soubeste tocar nos pontos certos. E eu fiquei a lembrar-me de tudo.
Da noite em que te seduzi com o meu curto vestido preto. Da outra, mais ousada e mais certa, em que foste para casa com a camisa suja das minhas pinturas de índia. Lembrei quando dizias que tardava e tinhas de ir, mas depois te alongavas nas despedidas e era eu que tinha de ir. De quando saías a medo do quarto, apesar de já toda a gente saber que lá dormias. De me dizeres todos os dias que eu estava linda. De me sentir linda. Da minha melhor amiga me ter dito naquela manhã que eu estava linda...
Ou de quando me apalpavas, qual garoto da escola, e desatavas a correr e a rir. Lembro-me de andar feita tonta à tua procura porque a sessão de cinema estava quase a começar e, encontrei-te, completamente descansado e distraído, a jogar um qualquer jogo de tiros com um pequenote que apareceu. Afinal o sr. engenheiro era só um miúdo grande!
Depois lembrei-me de quando me agarravas por trás e me sussuravas ao ouvido convites indiscretos. De como pareces tão respeitável mas dizes obscenidades na cama. De como és homem o suficiente para te permitires chorar no meu colo. E lembrei da última vez, não a mais recente, mas a última, em que só me abraçaste com força e assim adormecemos, eu e tu, na certeza de que naquele abraço estava todo o nosso amor.
Eras o meu plano A. O meu ideal. Aquele de quem toda a família iria gostar. Demasiado perfeito para seres perfeito. Esqueces-te de que sou uma pessoa estranha, incomum. Uma estrangeira na minha pele. Uma exilada de mim mesma (como diz a Patrícia Reis).
Conhecemo-nos mal, sabes? Nunca me soubeste toda. Não sabes que há joguinhos que não tolero...E já não tens o meu coração. Mesmo assim, fora esse teu jeito egoísta de amar, tenho de ti uma boa imagem. Digo que és uma boa pessoa.
Estava convencida de que eras agora o nada que já foi tudo. Que eras passado sem futuro. Que já não eras exaltação, mas serenidade. Já passou tanto tempo! Devias já ser esse ponto final e que curiosamente é o nome que me aparece quando estás no msn. És o meu fantasma e ontem abalaste-me o mundo. Não te percebo. Nunca perceberei homens como tu. Mas gostava, gostava mesmo, de saber o que se passa nessa alma. Mas para isso, era preciso que a tivesses...
Não te quero esquecer. Quero ser velhinha e redescobrir um dia o teu nome com carinho. Até lá, vai à tua vida e tenta ser feliz. Farei o mesmo.

2 comentários:

MC disse...

just.. beautiful.

Marisa disse...

Obrigado mc. :)
just..fucking real! :)