A Louca

O empregado da área de serviço olhava-a demoradamente, curioso e surpreendido, à distância de metros, dentro do carro. Se a tivesse visto antes, fora dele, não teria dificuldade em apelidá-la de louca. Só os loucos dos filmes americanos e desorientados aparecem assim. Jovem, tinha o cabelo volumoso que secara debaixo da luz da Lua, sempre o tivera assim, qual pequena bruxa, mas ela parecia pouco preocupada com essas futilidades da beleza. Vestia um pijama laranja, composto por uma camisa de manga curta com um desenho na frente - 2 vacas no Hawaii - e uns reduzidos calções brancos com riscas horizontais laranja. Para esconder a depilação por fazer vestia ainda um robe rosa, fino, mas que deixava ainda assim a parte final das pernas a descoberto. Nelas, um olhar que não precisava de ser muito atento deixava anunciar pêlos que despontavam, pêlos como de barba, causados certamente por uma depilação preguiçosa, ou simplesmente mais barata, feita com lâmina.

Como se o resultado final desta combinação fosse ainda insuficiente para autorizar uma desconfiança legítima nas pessoas que por ela passavam, calçava umas havaianas pretas, maiores do que o seu pé, e tinha as unhas dos pés pintadas de rosa pitanga. Na mão segurava a mala como quem segura uma pasta de trabalho, o braço hirto, caído ao longo do corpo, e um estranho sentido de importância como se fosse uma executiva a caminho do trabalho. Sabia que as pessoas iam olhar mas, era noite, e ela não estava assim tão importada porque a noite protege os loucos. Enquanto caminhava, ia cantarolando La Foule, de Edith Piaf. Era uma louca alegre.

1 comentário:

a vaneka de sempre! disse...

eu vi! ninguém me contou...