Bom entendedor

Irrito-me com a minha própria cobardia, num sinal claro do quanto ainda me falta. Ele comentava do "gajo (que) é tão maricas", rematando com o tradicional "respeito mas não entendo", e eu respondi grave e solenemente "eu respeito e eu entendo" e deixei que ele pensasse o que quissesse. Respondi-lhe ainda que o dia 8 tinha sido um dia de progresso em Portugal na democracia e nos direitos humanos e deixei que ele pensasse o que quissesse. E logo o tradicional desde-que-não-venham-ter-comigo, logo o tenho-um-amigo-que-é-e-sempre-fomos-amigos, logo as atenuações e as justificações, eles, eles, lá longe, eles. E eu não disse nada mais e deixei que ele pensasse o que ele quissesse. Cobarde.

De resto pergunto-me se ela já o entendeu também. Digo-me que não é importante mas, em contradição, abri-lhe a porta para que descobrisse sozinha, porque me é estranho fazer disso conversa, quero que ela saiba mas não sei contar-lhe. As coisas só têm a importância que lhes dás, repetes. Não estás habituada a este silêncio, não houve perguntas de quando, como, porquê, quem, realidade que é mais fácil ignorar e continuar, medo, será medo (?). Uma omissão sempre presente, que não precisa de se afirmar para existir, ignorância propositada, mas a que propósito (?). Saberá? Talvez que não lhe importe saber. Talvez que não seja facto importante o suficiente (é-o, para mim) para ser notado naquilo que ela já vê em mim. O invisível e essencial.

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