(Taras e) Manias

Tens essa estranha mania que ele falava. Quando te deixas cativar por alguém - que tudo é uma questão de permissão, abusiva, raras vezes só súbtil - procuras o que há nela, como quem escava em busca de algo que não se vê à superfície mas que tu sabes estar lá. Revelou com discrição e uma secreta sensação de provocação que lhe cresceu no peito e agora não consegues deixar de pensar nisso. Agora queres o resto, despertado. Queres a história que lhe mudou a visão, o ponto de viragem que fez de si pessoa inteira e lhe colocou o mundo dentro, queres ir onde outros não foram, transpôr uma fronteira sem disso fazer alarido, e não sabendo que era impossível foi lá e fez. Sempre gostaste disso, arqueóloga de emoções antigas que deixam a sua marca na história que se vai sendo, e sempre te moveste assim, descobrindo-te na descoberta, pacientemente, palavra a desejar palavra num encontro imperfeito e sem destino marcado, até que te voltem a dizer só vais até onde eu deixar. Colocas-te nas suas mãos e esperas pelo toque derradeiro que te há-de definir os dias, a resposta que chega imperceptível debaixo de uma confissão, procuras o escândalo da sua essência, o obscuro intocável mas presente, as suas felicidades mesmo se fingidas, até um certo gosto nelas, espasmo e arrepio e grito, e também os seus medos e vontades, as carnais e as outras menores, queres saber do primeiro amor e da primeira dor, do impacto daquela música que lhe dá ainda nova luz aos olhos, a lágrima que lhe nasce naquele poema que sabe de cor, tudo, diz de uma vez que queres tudo, precisas tanto desse tudo e não tencionas bastar-te em ti, por isso, por isso. Beijar-lhe então a boca como necessidade extrema e sorver-lhe toda a vida de um só gole. Deixa que te leve. É só uma estranha mania.

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