Não sou adulta bastante para saber usar uma verdade sem me destruir

Essa coisa sobrenatural que é viver. O viver que eu havia domesticado para torná-lo familiar.

(...) onde estava o meu destino maior? um que não fosse apenas o enredo de minha vida.

Terei toda a aparência de quem falhou, e só eu saberei se foi a falha necessária.

Assassinato o mais profundo: aquele que é um modo de relação, que é um modo de um ser existir e outro ser, um modo de nos vermos e nos sermos e nos termos, assassinato onde não há vítima nem algoz, mas uma ligação de ferocidade mútua.

Não sou adulta bastante para saber usar uma verdade sem me destruir.

O inferno pelo qual eu passara - como te dizer? - fora o inferno que vem do amor. Ah, as pessoas põem a ideia de pecado em sexo. Mas como é inocente e infantil esse pecado. O inferno mesmo é o do amor. Amor é a experiência de um perigo de pecado maior - é a experiência da lama e da degradação e da alegria pior. Sexo é o susto de uma criança.

Pois prescindir da esperança significa que eu tenho que passar a viver, e não apenas a me prometer a vida. (...) Eu não tinha coragem de deixar de ser uma promessa, e eu me prometia, assim como um adulto que não tem coragem de ver que já é um adulto e continua a se prometer a maturidade.

Quando eu precisar, então eu terei, porque sei que é de justiça dar mais a quem pede mais, minha exigência é o meu tamanho, meu vazio é a minha medida.

A revelação do amor é uma revelação de carência - bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o dilacerante reino da vida.

O grande bocejo da felicidade.

A vida é uma missão secreta.

A desistência tem que ser uma escolha. Desistir é a escolha mais sagrada de uma vida. Desistir é o verdadeiro instante humano. E só esta, é a glória própria de minha condição. A desistência é uma revelação.


passagens soltas de A Paixão Segundo G.H.
Clarice Lispector

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