Tardes que tardam a entardecer em enternecimento

Disseste que a vida é cheia de encontros e desencontros e que, por isso, cada encontro devia ser um momento de graça, como uma bênção recebida. Dei-te razão, mesmo sem a ter para te poder dar. Hoje encontrei-te. Olhaste-me surpreendida, as perguntas costumeiras que raramente significam de facto alguma coisa, e prosseguiste demasiado apressada para a calma que eu secretamente te pedia. Não olhaste sequer para trás e, se para ti foi naturalmente, ou só, tu a seguires o teu caminho, para mim, que tudo vejo em lado nenhum, foi um facto que me merece este registo do agora. Avisam-me mas faço ainda muito isso. Nada de mais afinal, mas há momentos em que as ruelas noite acima e noite adentro percorridas em silêncio e as tuas lágrimas de riacho dedilhadas na viola me ecoam como pertença. Um encontro, todavia, um encontro. 

Tivesse eu uma moeda no bolso e poderia apostar que me acharam à tua espera. O pressuposto é suspeito do óbvio mas isso não o torna mais verdade. Ainda assim, de uma maneira pouco apropriada mas que me envaidece, sinto um prazer inadvertido na ideia de que me achassem à tua espera. Como naquele dia em que, era eu mal chegada, e ele disse "ela precisa de ti" e me vi cheia de forças para te salvar do teu mundo e para te proteger do outro, o que também era o meu. Eu tinha uma missão.

Não o dizemos para que a coisificação não se torne flagrante no seu utilitarismo mas ambas sabemos que já houve o momento e daí a sacralidade de cada encontro no aqui, tempo bastante. A perda pode ser um mal necessário. Usamo-nos sem expiações ou outros arrependimentos, sabemos ao que vimos e servimos o nosso propósito. Cumprimo(-no)s (n)as nossas missões.

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