Anjo-da-guarda

Falávamos do direito dos pacientes a saberem o seu real estado, ainda que terminal, ainda que contra a vontade das famílias. Ela teimava que não, às vezes é melhor que não se saiba. Dizia que saber condiciona, o futuro a moldar o presente, a verdade a minar a coragem e o ânimo. Percebi depois. Se o cheiro se notasse, a perna teria que ter sido amputada. Se a bactéria tivesse chegado ao osso, a perna seria amputada. Esteve demasiado perto, tão estupidamente perto e tão real. Só lhe disseram depois e eu só hoje sei a importância disso, de não lho terem dito. O tempo tem finalmente feito o seu trabalho - a ferida começa a fechar e, se tudo continuar a correr bem, ficará fechada no final de Fevereiro, apostei eu. O milagre tem afinal o nome de morfina e a médica é afinal anjo-da-guarda. A minha mãe chama-lhe anjo-da-guarda.


(está quase, falta pouco. confia.)

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