Brassicaceae

Calçar as botas de borracha, galochas, chamarão elas. Sentir a terra a afundar-se debaixo dos pés numa ou noutra zona. Subir para cima da carrinha e sentir-me rainha do mundo. O cheiro a turfa molhada, a turfa molhada a desfazer-se entre os dedos, as unhas encardidas no final. O som ritmado do tractor, sempre igual nas alegrias e nas tristezas. Há quantos anos não fazias aquilo mas ainda não perdeste o hábito. Uma planta e depois outra e depois outra. Centenas de plantas enfileiradas de verde, jovens e bonitas. Então é assim a vida. O sol e o vento a bater nas ventas, o dia que passa entre pensamentos e nuvens. Ao longe avistam-se as cezaredas, os geradores eólicos a funcionar, serras e árvores. É possível que te distraias com uma ideia e demores a tarde toda para a encontrar novamente. No final, o céu a mudar de cor, ouvem-se já os grilos, é terminada a tarde. Olhar e ver o resultado, aquela extensão de verde foste tu, aquele produto será alimento e família mas por agora é só o teu orgulho que se sente nas costas cansadas. O trabalho pode libertar. Subir a ladeira e o carro patina na lama, só mais um esforço. Despedir-me ainda do Strike, do Banzé, do Peter e do Feeling, a que o meu pai chama Pirlim e a minha mãe chama Herança, embora nenhum destes seja o seu nome e o cão os aceite a todos, pudéssemos nós ser assim. O teu pai comenta “não tens disto lá no teu escritório, não é?”. Sorrio e digo-lhe que não, lá não há disto. Sou da terra.

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