(És) tudo o que não cessa.

Não conto as horas com medo de que o dia se deixe levar na corrente do tempo. Esqueço na mesa do pequeno-almoço qualquer relógio que se atreva a apressar-nos e deito-me de novo à cabeceira do inesperado, ao alcance da tua mão. Aqui a vida é diferente, sente-se palpável ainda que invisível, e pode atravessar-se a pé a distância massiva que vai de hoje até ao devir de todos os futuros. Aqui o sol é altruísta e põe-se tarde para permitir a esperança dos regressos e atrasar as partidas inevitáveis. Ouve-se a chuva por trás das vontades a acalmar o calor insistente do corpo e o raio que cai dos céus é tão determinado como o primeiro murmúrio do desejo, a voz que assenta terna sobre aquela canção que desagua na tua boca, a ideia útil que constróis na iminência de uma utopia. Não me canso nunca de te ouvir. Não me deixes ir. Não me acordes ainda, enquanto és sonho, irrealidade mais bonita. Aqui, adormeço e renasço com a serenidade de quem não precisaria de mais do que isto para uma noção concreta de felicidade. E é tão fácil fechar os olhos e não pensar, tão fácil deixar-me ir e nem olhar para trás. É tão fácil sentir, tão fácil acreditar. Tenho medo de saber o quanto poderia ser feliz contigo.

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