Há-de estar por aqui por ser uma dessas perguntas das noites mais longas, talvez ainda primeira do que aquela de deus, já que a humanidade sempre se mostrou mais real do que este, quer nas dores que inflinge, quer no incrível de executar impossíveis. Pensar nisso é assim imergir numa dúvida subsistente que veio não sei de onde mas que ficou para ser um alerta ao sentido dos dias. Porque a isso, não há como escapar. Se é certo que nem tudo a preto e branco faz sentido e que a vida não tem lados por onde a possamos observar e julgar, somente lacunas e relevos onde nos vamos ajustando à circunstância de sermos pessoas de fazeres, pensares e sentires, é igualmente verdade que até a chuva se recusa a ir com o vento se para aí estiver virada e que as pedras existem firmes na sua convicção de serem pedras por mais pontapés que levem. O luxo de ser imparcial está reservado apenas aos mortos. Escreveram que o mal acontece quando as pessoas de bem tapam os olhos e eu queria tanto desacreditar-me disso.
Todavia, é preciso relembrar as aulas de Filosofia e o professor Fausto no seu nome adequadíssimo enquanto lhe escutamos a lógica das premissas, proposições e outros afins, a voz de tenor enquanto me censura a importunação num dia em que não sei o que me deu, pois que sim que a vida é uma enorme rotina e que nada daquilo realmente importa à felicidade das almas – não mais do que me faria feliz agora uma daquelas sobremesas, toucinho do céu, ou um daqueles pãezinhos com queijo, meu toucinho do céu – mas que aquele não era o tempo para dizê-lo, por agora calar e escutar, a menina está a ser muito inoportuna, mesmo que a palavra tenha sido outra bastou a adrenalina de dizê-lo, no final uma recompensadora vaidade perante a turma, vendo bem, poucas as vezes em que não hesitei na vida, só mesmo nisto e no amor.
Mas voltemos atrás - já que nisso o tempo é-nos favorável, a vida afinal é bela, e mal se nota a intermitência na ordem natural destas ideias - para sumariar o que me trouxe e tão-pouco me abandona. A Filosofia, como sempre, para resgatar o que possa existir de verdade ou para assertar que não há verdade que nos salve e a que possamos agarrar-nos nem na mais tempestuosa tormenta. A palavra, para encher chouriços, perdão, um texto que se resume a três frases cuja importância se confirmaria pelo simples facto de ter isto começado nelas, como quem começa com o fim já em mente, tanta coisa assim na vida e nós que teimamos em enganarmo-nos só porque gostamos de fingir-nos surpreendidos, ah, não estava nada à espera. E, finalmente, a lógica, a mesma que desafia os ímpetos do peito, para concluir que a indiferença conduz a uma inacção, mas nem sempre uma inacção resulta duma indiferença.
Não tenho medo da minha indiferenca mas assusta-me a minha incapacidade de acção. E, porém, já ela dizia que é pelos actos que vivemos, não esqueçamos.
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