Monogamia ou Monotonia? :)

"A bigamia consiste em ter uma mulher a mais. A monogamia é a mesma coisa", Oscar Wilde.
"O adultério é a democracia aplicada ao amor", Henry Mencken.
Num dos mais recentes episódios de TLW, uma das personagens afirmou a sua impossibilidade de entrar numa relação monogâmica. Depois deste episódio e da dicussão lançada em torno do livro "
The Myth of Monogamy: Fidelity and Infidelity in Animals and People", resolvi-me a pesquisar e reflectir sobre o tema e deixo hoje à vossa consideração as minhas conclusões.

Antes de mais, importa definir o conceito de monogamia. Esta "acontece quando um indivíduo só tem um único parceiro durante um determinado período de tempo e representa uma espécie de contrato social, uma relação de propriedade privada entre os agentes sociais, cada qual sendo proprietário da sexualidade do outro e a outorgação desse contrato é a fidelidade." (Wikipédia). Convém não confundir a não-monogamia com o adultério. O primeiro trata-se de uma "impossibilidade" psicológica (?) para manter apenas uma relação, já o segundo, bem..pode ser apenas uma rapidinha! :p

Ora, o que de extraordinário tem o livro referido (que infelizmente ainda não li mas que tem sido bastante comentado) é que vem contradizer a ideia enraízada de que homens e mulheres são naturalmente predispostos a viver juntos até que a morte os separe, afirmando que a monogamia nos humanos é uma combinação de muitas doses de preceitos religiosos (catolicismo qb), um bocado de pragmatismo económico (o direito à propriedade privada) e um toque de ingredientes sociais (reconhecimento da prole), sem esquecer, é claro, umas colheres de comodismo.

Segundo os autores (psicólogo David Barash e psiquiatra Judith Eve Lipton), a biologia mostra facilmente que vigora no comportamento humano um lado irracional e animal (a força dos instintos!), sendo que a sociedade cria mecanismos para minimizar ou reprimir esse nosso lado mais selvagem, de que a condenação do adultério pelos Mandamentos católicos é um claro exemplo. É realçado que a monogamia não é, afinal, instintiva em nós (de resto, até dava para desconfiar tendo em conta a constatação da enorme quantidade de práticas contrárias! :p ), mas sim um fruto das normas sociais que nos condicionam a padrões comportamentais, porventura, contrários à nossa natureza mais básica e primitiva.

E que melhor lugar para o comprovar senão na natureza? De acordo com Barash e Lipton, o facto de não ocorrer monogamia na Natureza pode ser explicado por uma simples contabilidade evolutiva - esperma é caro e óvulos são baratos -, ou seja, um macho normal de qualquer espécie produz milhares de espermatozóides todos os dias e está sempre à disposição (diz-se!) para novas relações sexuais, por outro lado, as fêmeas ovulam muito menos e, em caso de fecundação, têm que arcar com uma grande número de responsabilidades, normalmente designadas por "investimento parental". Com efeito, é este "investimento" que pode explicar o facto das fêmeas da maioria das espécies não ser tão propensa a aventuras extraconjugais, já que é toda uma equação de tempo, energia e risco que os pais biológicos depreendem para que a gestação e o nascimento das suas crias ocorra sem problemas graves.

Biologias à parte, existem sempre pessoas que se consideram extremamente morais e monogâmicas e que, no entanto, mantêm relações paralelas, quer puramente sexuais, quer emocionais, quer por simples desafio às regras, as sobejamente conhecidas monogamias de fachada. Toda uma cultura de aparências e de máscaras. Casais que se odeiam mas continuam juntos ou que se estimam de modo relativo mas vivem como estranhos. Mulheres que fingem uma monogamia mental, já que esse é o adorno obrigatório na nossa sociedade para qualquer mulher dita virtuosa. Homens que têm as suas inocentes escapadinhas, por vezes ignoradas outras toleradas, e que nenhum mal vêem nisso porque, afinal de contas, são machos, verdadeiros machos latinos (e dou por mim a pensar no Tony Soprano :p )! E pergunto-me de que adianta esta proclamada monogamia, quando há tantas poligamias mentais, emocionais, físicas?

Ao fim e ao cabo, vemos que a fidelidade (lembra-me sempre os cães), se não for espontânea, morre (e muitos autores defendem que espontânea, só mesmo no ínicio, depois nada mais é senão um acto de vontade). E isso depende, essencialmente, daquilo que nenhuma explicação científica é apta o suficiente para desvendar, daquilo que é a componente fundamental de toda a relação humana - o amor. Na realidade, é por causa deste factor que se encontra quem defenda que a emocionalidade e racionalidade intrínsecas ao homo sapiens o coloca na escolha (e não obrigatoriedade!) da monogamia, isto é, salientam a diferença entre viver o mito do relacionamento monogâmico por imposição cultural e o de viver uma relação que sustenta a monogamia como uma opção consciente compensadora, que traduz para o outro um sinal de disponibilidade, exclusividade e principalmente de empenho na relação.

Além destas duas correntes alternativas, encontrei ainda um conceito totalmente desconhecido por mim até então - o poliamor. Mais do que o "simples" conceito de poliamor, trata-se de, ter mais do que uma relação em simultâneo, sendo que isso é consentido por todos os intervenientes. No fundo, atrevo-me a dizer que é uma questão de sinceridade e de genuidade para com o Outro, levada ao limite. Na minha opinião, é um estado de espírito, quase uma filosofia de vida, mas que pode ser utópica e cruel se não estiverem bem cimentados esses princípios da não-propriedade. Até porque a liberdade consciente exige muito mais fibra e responsabilidade do que a conformidade instintiva. Para quem quiser saber mais, podem começar por aqui.

Não quero com tudo isto dizer que a monogamia é má e a poligamia é boa, atenção! Hoje, o meu papel é o de demonstrar que não existe nada dito normal (já viram o filme Kinsey?) porque nós seres humanos somos bichos demasiado complexo e que há mais modelos do que aqueles em que crescemos e nos habituamos a pensar como o único possível. De qualquer modo, devo acrescentar que, embora não me imagine noutra relação que não a monogâmica, não condeno os poliamores e afins (anda na moda os amigos coloridos e os swings), desde que se tenha em conta respeito por todas as partes envolvidas.

Independentemente de tudo isto, também eu acredito que, no futuro, a monogamia será construída de forma mais pensada (fruto de uma sociedade mais consciente da sua sexualidade) e que as relações são o que as pessoas fazem delas e não o que nos educam e condicionam para ser...
Sem pretender ofender ninguém, aqui fica a caricatura "à la Gato Fedorento" da típica reacção do luso exemplar à traição conjugal:
- Achas que estarias a trair o teu sentimento com a tua esposa, ao estares com outra mulher?
- Não!!!!
- E se ela estivesse com outro, estaria a trair o sentimento por ti?
- Sim!!!!

3 comentários:

JAM disse...

No fundo da questão.....nós, quer queiramos quer não, somos animais.....e sim a monogamia foi algo inventado pelo ser humano....agora a verdade é que certas espécies animais são monogâmicas....e a religião não faz certamente parte da vida deles, visto o humano ser o único animal burro a ponto de ter uma religião....
A monogâmia é uma escolha....também a bigâmia...

Na minha opinião cada um deve agir como deseja desde que o parceiro/a(os/as) esteja/m em acordo.
Dou-te o meu exemplo.....eu vivo a minha vida tendo em conta uma simples ideia....sou um animal e nada mais que isso!
Mas se me perguntares se, como animal, sou bigamo...respondo-te facilmente que não....
É só uma questão de nos questionar-mos ( ao animal dentro de nós ) se estaremos dispostos a uma vida bigama...

Noutro ponto não entendo muito bem a bigâmia....porque ter uma parceira....é dificil ....quanto mais ter múltiplas....só mesmo o super-homem aguentaria estar com todas ao memso tempo ....e nem me refiro ao sexo....só me estou a referir ao factor psicológico de aturar várias mulheres ao mesmo tempo...
( imaginemos que todas tinham a menstruação ao mesmo tempo.......Suicídio na certa...)

Marisa disse...

Lol
Bem reparado! Sobretudo essa da menstruação! :D
**

cromoleq disse...

Um reparo, os espermatozóides são baratos e os óvulos é que são caros.